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Foto do escritorSofia Ferreira

Colapso do Silicon Valley Bank e o fantasma da crise financeira de 2008

Silicon Valley, o cenário paradigmático futurista, ninho de inúmeras startups no ramo da tecnologia avançada e da inovação, é um nome que não passa despercebido. Foi em março do presente ano que, por cá, mais se ouviu falar deste nome, devido ao crash do Silicon Valley Bank (SVB), que constituiu a maior bancarrota desde o Washington Mutual, no pico da crise de 2008.


@SF Travel


Especializado no financiamento de startups, o SVB, 16º maior banco dos EUA, detinha cerca de 209 milhões de dólares de ativos no fim de 2022. Foram vários os fatores que levaram ao colapso de um dos maiores bancos dos EUA.


Entre 2020 e 2021, com o auge da pandemia, o SVB registou um acentuado crescimento, tendo obtido significativos depósitos, com os quais adquire obrigações do Tesouro, a longo prazo. Acontece que, com o objetivo de fazer face à crescente inflação no país, a Reserva Federal dos EUA aumenta as taxas de juro, levando a uma consequente diminuição do valor destes títulos.


Houve, também, uma perda de capacidade de investimento por parte das startups, que se explica pelo aumento dos juros dos empréstimos – o endividamento é um meio comumente utilizado pelos investidores para o seu financiamento. Isto levou a uma retirada de depósitos do SVB.


Para tentar captar capital, o SVB vende uma carteira de ativos que, por ser composto sobretudo por dívida pública, perdeu valor com o aumento dos juros, pelo que esta venda se traduziu numa perda de 1,8 mil milhões de dólares. Subsequentemente, tenta vender ações, mas a propagação da notícia da falta de liquidez desta instituição, essencialmente através dos meios de comunicação social e das redes sociais, levou a uma corrida generalizada ao banco por parte dos investidores. Por conseguinte, deu-se queda das ações em bolsa em cerca de 60%.


O SVB foi encerrado, tendo as suas ações sido colocadas sob controlo do Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC), que tem como objetivo a garantia dos depósitos bancários. O Departamento do Tesouro, o FDIC e a Reserva Federal (Fed) garantiram que os norte-americanos não assumirão as perdas do banco e os depósitos serão protegidos.

A sucursal britânica (SVB UK) foi comprada pelo HSBC por apenas 1£, protegendo 6,7 mil milhões de depósitos.


Como efeito contágio, o Signature Bank, localizado em Nova Iorque, também colapsa, tendo os seus clientes retirado os seus investimentos, levando a que a soma dos depósitos levantados tenha ascendido ao valor de 10 mil milhões de euros. O plano de garantia aplicado ao SVB foi também aplicado aqui.


Questionava-se até que ponto é que isto poderia contagiar as restantes economias, nomeadamente na Europa. Paolo Gentiloni, Comissário Europeu, afirmou que não haveria qualquer contacto direto com a Zona Euro, mas que estaria a ser acompanhada de perto a possibilidade de haver um contacto indireto.


A nível europeu, as reações à queda do SVB foram consentâneas, afirmando-se que a falência do SVB se tratava de um alerta, mas não havendo necessidade da tomada de medidas imediatas e preventivas. Aliás, o Banco Central Europeu (BCE) não planeou qualquer reunião de emergência, considerando que o impacto da rutura do SVB seria limitado, mantendo a sua postura no aumento das taxas de juro.


Os sistemas bancários europeus não têm os mesmos problemas de liquidez de que padecia o SVB. Ademais, importa salientar uma grande diferença entre o sistema norte-americano e os sistemas europeus: os EUA têm uma Instituição de garantia de depósitos (o FDIC), ao passo que as várias economias europeias que partilham o euro têm a sua própria Instituição de garantia.


Foram, no entanto, registadas quedas abruptas nos valores das ações de bancos como o Commerzbank, o Societe Generale, o UBS e, na liderança das quedas, o Deutsche Bank.

A 15 de março, o Credit Suisse, banco suíço, recorre a um financiamento junto do Banco Nacional Suíço (BNC) no valor de 50 mil milhões francos suíços e, a 19 de março, foi anunciada a aquisição desta Instituição pela UBS, considerando-se ser esta a melhor solução (solução esta que ronda os 3 mil milhões de euros).


Pela sequência próxima dos eventos, o primeiro e óbvio raciocínio seria assumir a crise do Credit Suisse como efeito do colapso do SVB; contudo, o banco suíço tem uma longa lista de escândalos e perdas significativas que parecem afastar a correlação que poderia aqui existir.


Estaremos a reviver o ano de 2008?


Fala-se num paralelismo entre a crise de 2008 e a situação atual, afirmando que os acontecimentos que se estão a dar agora são uma reprodução assustadora do que se viveu no passado. O Fundo Monetário Internacional afirma haver algumas semelhanças, mas explica que são fundamentais as diferenças relativamente à crise de 2008.


Aquilo que está a acontecer hoje é uma perda de confiança dos clientes nas Instituições financeiras. Com o setor financeiro instável, a incerteza é crescente.


A preocupação com o setor bancário é apenas uma num elenco que é extenso: a inflação galopante e o consequente aumento das taxas de juro, o aumento da dívida pública, um crescimento económico modesto, políticas orçamentais mais apertadas e um fosso de desigualdades mundiais cada vez maior. São estes os problemas que o FMI aponta como urgentes.


No dia 11 do presente mês, o relatório World Economic Outlook, elaborado pelo FMI, revela que a quebra que se tem vindo a registar na economia é muito mais pronunciada nas economias avançadas e diz ainda que a redução da inflação dar-se-á a um ritmo mais lento do que aquele que era previsto. No referido relatório, prevê-se um abrandamento geral do crescimento a médio prazo, e isto pode dar-se por duas razões: pela convergência e equilíbrio dos vários países ou (e este é o lado negro, mas também o mais realista) pelo impacto de uma pandemia, de um ritmo lento das reformas estruturais e pela crescente ameaça de fragmentação geoeconómica que levará a tensões comerciais.


Apesar de qualquer previsão que se faça quanto ao futuro económico-financeiro ser incerta, podemos afirmar com convicção que o cenário não é favorável e que os próximos tempos serão adversos: o crescimento económico é historicamente lento e os riscos financeiros cresceram.

Sofia Ferreira

Departamento Sociedade


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