Eduardo Cabrita demite-se de funções do Governo
- José Miguel Barbosa
- 4 de dez. de 2021
- 4 min de leitura
O ministro da Administração Interna anunciou esta Sexta-Feira num comunicado sem direito a perguntas a sua saída do Executivo. A exoneração visa proteger o Governo a dois meses de eleições.
Foi por opção própria que Eduardo Cabrita abandonou o cargo que exercia desde 2017. Esta decisão ocorre no dia em que foi formalizada a acusação de homicídio por negligência ao motorista de Eduardo Cabrita, Marco Pontes, por parte do Ministério Público. Este processo remonta às circunstâncias do dia 18 de Junho de 2021 onde Nuno Santos, um dos funcionários que integrava uma equipa de trabalhadores na berma da A6, foi atropelado junto ao separador central por um carro que transportava Cabrita, ao serviço do Governo.
O agora ex-ministro disse hoje, em declarações à imprensa, que foi apenas o “passageiro” e recusou "qualquer aproveitamento político de uma tragédia pessoal” que poderia ter consequências negativas para o Governo a pouco tempo de eleições legislativas. Afirma ainda que a acusação por parte do MP é o “Estado de Direito a funcionar”. Nuno Santos tinha 43 anos e deixou órfãs duas filhas menores.
Cabrita rima com polémicas
Outro assunto onde Cabrita foi alvo de grandes críticas ao longo do seu mandato envolveu outra morte, desta vez de um cidadão ucraniano nas instalações do SEF no aeroporto de Lisboa em Março do ano passado. A morte de Ihor Homeynuk, atado com fita adesiva por mais de oito horas, algemado e brutalmente agredido, chocou o país. As críticas viraram-se para o agora ministro demissionário após as reacções de Cabrita (ou a falta destas), em que a oposição partidária o acusa de ter uma elevada falta de empatia e humanidade. As críticas prolongaram-se durante todo o processo de averiguação de responsabilidades, bem como no que toca às condolências à família da vítima que, segundo a viúva do ucraniano, nunca foram entregues.
Seguiu-se a demissão da directora do SEF que continuou na esfera de Cabrita, mas agora como sua assessora. A extinção do SEF foi envolta também em controvérsia por discórdias entre o ex-ministro e o Director Nacional da PSP. A autoridade de Migração e Fronteiras tem agendada o seu fim em Janeiro do próximo ano, depois de ter sido aprovado em votação final na Assembleia da República, onde agora vai ser chamada Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo.

O silêncio com que Cabrita lidou com o caso, a mudança substancial de testemunhos (a notar que a primeira declaração de óbito dava conta da morte como tendo sido provocada por causas naturais) elevaram o tom das contestações. Os inspectores dados como responsáveis pela morte de Ihor foram, entretanto, condenados por homicídio por negligência com penas de prisão entre sete e nove anos.
No Verão de 2019 dava-se por descoberto o caso das golas anti-fumo inflamáveis. Tratou-se de um contracto feito com a Administração Pública no valor de 125 mil euros por 70 mil golas, soma muito acima do valor do mercado. Mas além do preço elevado, as golas anti-fumo distribuídas por populações do interior do país na típica altura dos fogos eram incendiáveis e sensíveis ao calor, o que poria em perigo quem as usasse. O caso transitou para o Ministério Público, de onde resultaram acusações a pessoas singulares e colectivas. Apesar das demissões dentro do MAI, houve um ajuste directo de 40 mil euros pagos por este ministério em despesas judiciais a arguidos envolvidos no processo judicial, o que alargou ainda mais o âmbito da polémica.
Mais recentemente, em Maio deste ano, os festejos de campeões nacionais de futebol masculino foram alvo de amplas críticas. As celebrações junto ao estádio José Alvalade, organizadas e monitorizadas pela PSP (órgão que responde directa e hierarquicamente ao MAI) juntaram dezenas de milhares de adeptos sportinguistas num ajuntamento que muitos consideraram forçado e onde o distanciamento e medidas de segurança sanitária foram uma miragem. Isto porque foram instaladas barreiras na zona dos festejos que condicionaram a movimentação de quem passou pela festa leonina e aglomerou em pouco espaço os muitos milhares que ali se deslocaram.
Em resposta, Cabrita afirmou que o Sporting Clube de Portugal se recusou a colaborar com o IGAI. Estas declarações seriam, mais tarde, desmentidas pelo clube e a sua maior claque, a Juventude Leonina, que disse que havia convocado as manifestações em diálogo estreito com a PSP e o Município de Lisboa.

Nas reacções à demissão de Eduardo Cabrita, os partidos da oposição na sua generalidade manifestaram um sentimento de que o sucedido pecou por tardio. Em declarações à imprensa, consideraram que o ex-ministro já não tinha condições políticas para continuar a exercer o mandato inflamado por polémicas há muito tempo. Eduardo Cabrita foi o ministro da Administração Interna que mais tempo esteve em funções desde o 25 de Abril 1974.
Van Dunem assume pasta do MAI
Francisca Van Dunem, actual ministra da Justiça, vai acumular a pasta da Administração Interna até às próximas eleições. A vaga deixada por Eduardo Cabrita vai ser preenchida pela jurista até Janeiro, comunicou hoje a Presidência da República que aceitou duplamente a demissão e nomeação no MAI. A posse está agendada para este Sábado às 15h00.
Nota: O autor escreve segundo o Antigo Acordo Ortográfico
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