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O direito a desligar

  • Foto do escritor: Gonçalo Angeiras
    Gonçalo Angeiras
  • 24 de nov. de 2021
  • 3 min de leitura

O teletrabalho vulgarizou-se nos últimos dois anos devido à pandemia que nos obrigou a ficar em casa, colocando à vista de todos uma série de desafios ao mercado de trabalho e à forma como olhamos para a legislação laboral.

Num espaço pessoal, torna-se mais difícil definir os limites do início e do fim do dia de trabalho porque, muitas vezes, o espaço de trabalho está instalado em lugares da casa que também são de descanso, por isso o “direito a desligar”, ou a ficar offline, é um dos temas que tem merecido destaque e discussão, levando o Partido Socialista a apresentar uma série de alterações ao Código do Trabalho, onde este direito passa a estar salvaguardado.

DIREITO A DESLIGAR


No passado dia 3 de novembro, foram aprovadas no parlamento português alterações ao Código do Trabalho, passando este a prever, desde então, o direito a desligar dos trabalhadores no período de descanso, impedindo (salvo algumas exceções) o empregador de contactar o trabalhador.

Com esta alteração à lei laboral fica expresso que o empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ficando ressalvadas situações de força maior. A violação deste dever constitui uma contraordenação grave.

Qualquer procedimento inconveniente ou danoso para o trabalhador, pelo facto de este exercer o seu direito, representa uma ação discriminatória por parte do empregador, que procura prejudicar um indivíduo em termos de condições de trabalho e de evolução na carreira apenas e só por efetivar um direito que lhe assiste.

Estas alterações ao Código do Trabalho foram propostas pelo Partido Socialista, contando com os seus votos a favor, com a abstenção do Bloco de Esquerda e do PCP, e votos contra do PSD.

Foram ainda aprovadas no mesmo dia outras mudanças à lei laboral, desta vez sobre o teletrabalho, uma modalidade que conquistou a atenção de todos ao longo da pandemia.

Esta alteração prevê que os empregadores terão de passar a promover contactos presenciais entre os trabalhadores em regime de teletrabalho e as chefias com intervalos não superiores a dois meses.

O empregador tem ainda como dever especial "consultar, por escrito, o trabalhador antes de introduzir mudanças nos equipamentos e sistemas utilizados na prestação de trabalho, nas funções atribuídas ou em qualquer característica da atividade contratada" e "fornecer ao trabalhador a formação de que este careça para o uso adequado e produtivo dos concretos equipamentos e sistemas que serão utilizados no teletrabalho".


REAÇÕES NA IMPRENSA INTERNACIONAL


"Alguma vez teve um chefe persistente que não para de enviar mensagens quando está fora do trabalho ou em descanso? Em Portugal, isto tornou-se agora ilegal."


É assim que começa a notícia da CNN sobre as alterações à lei laboral portuguesa. No entanto, a estação norte-americana não foi a única a falar do “direito a desligar” português, que também mereceu a atenção do Financial Times, do The Guardian, da Associated Press, da BBC, entre outras.

Todas estas estações aplaudiram a implementação deste direito, sendo que no Guardian podemos mesmo ler que “Os países que protegem o direito das pessoas a um equilíbrio saudável entre a vida profissional e familiar estão a responder de maneira adequada à cultura de trabalho moderna”, referindo mesmo que já vários países preveem este direito, como é o caso da França, Espanha, Bélgica e Argentina, por exemplo.

No Daily Show, o comediante Trevor Noah também dedicou algum tempo a esta questão, comparando de forma satírica a evolução da legislação laboral e dos direitos dos trabalhadores na Europa e nos Estados Unidos:

Uma vitória dos trabalhadores em Portugal e na maioria da Europa é ilegalizar que o patrão nos contacte a partir das cinco da tarde. Entretanto, na América, uma grande vitória laboral é que agora os trabalhadores da Amazon podem escolher em que garrafas, de vidro ou plástico, querem urinar”.


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