A criminalidade, na cidade do Porto, e o sentimento de insegurança, advindo deste aumento, foram noticiados no mês passado, através dos meios de comunicação. Todavia, será que estes dois conceitos, criminalidade e insegurança, estão relacionados? E a criminalidade? Será que podemos afirmar, concisamente, que aumentou, de facto? Potencialmente, a resposta imediata será sim. Todavia, tais afirmações não se revelam totalmente lineares.
De 2022 a agosto de 2023, a criminalidade no distrito do Porto aumentou cerca de 8%, nomeadamente os furtos e/ou roubos, o tráfico de droga, e também situações de violência. Fruto desta situação, destacam-se dois aspetos: o escasso policiamento na ótica dos empresários noturnos e o aumento do sentimento de insegurança por parte dos moradores. Inevitavelmente, é um tema que merece a atenção, não só da comunidade, como de todas as entidades aptas para intervir nesta problemática. E, neste sentido, e enquanto estudante da área, creio que a presença da Escola de Criminologia, com o seu conhecimento técnico e científico sobre o fenómeno, permite uma visibilidade mais ampla daquilo que é a Criminologia, bem como uma valorização daquele que é o trabalho de um criminólogo/a. No fundo, nada mais é do que atribuir, enfim, a voz e a palavra, a quem, de facto, nutre um conhecimento especializado sobre tal. Parece lógico. Mas a desvalorização, ainda existente, da área, leva a que esta lógica nem sempre esteja presente tanto quanto gostaríamos.
Urge, ainda, questionar alguns aspetos. Quando mencionamos o aumento da criminalidade existem preceitos teóricos que são necessários reunir: nem sempre o dito “aumento da criminalidade” se traduz no aumento, de facto, da mesma. Isto porque sabemos que as estatísticas criminais raramente traduzem um retrato fiel daquela que é a criminalidade real. Tal deve-se a crimes que acontecem e não são reportados; crimes que foram reportados e que, todavia, a vítima desistiu de avançar com o processo… são situações que influenciam o conhecimento total da criminalidade existente. Portanto, diria que é necessário apreender se este “aumento da criminalidade” não constitui apenas um aumento do reporte dos atos criminais, e porquê. Ou seja, se está a existir um incremento do reporte destas situações, devemos compreender o que está na base de tal e o que tem levado as vítimas a um maior reporte dos casos criminais. Pode ser um conjunto diversificado de fatores. Por outro lado, podemos, ainda assim, estar, de facto, na iminência de um aumento efetivo da criminalidade. E, se tal se verificar, é necessário intervir e compreender o que está a potenciar o aumento do crime e como podemos, e devemos agir.
A par disso, verificamos o aumento do sentimento de insegurança dos moradores no seguimento do aumento da criminalidade. Todavia, nem sempre estes dois construtos se encontram relacionados. Isto porque nem sempre o sentimento de insegurança advém exclusivamente da existência de crime e de experiências efetivas relacionadas com o crime. Um indivíduo pode-se sentir bastante inseguro, sem alguma vez ter sido vítima (direta ou indiretamente) de um crime, por exemplo. O sentimento de insegurança dos cidadãos relaciona-se frequentemente com características que associam ao crime, sem necessariamente existir essa efetiva relação. Fatores como a falta de luminosidade nas ruas, o escasso policiamento (relatado, inclusive, pelos empresários), a falta de manutenção dos jardins e de outros elementos do espaço, a presença de incivilidades como lixo pelas ruas, são comumente associados, pelos indivíduos, ao crime. No fundo, estas condições, uma vez associadas à criminalidade, tornam o local mais inseguro, na perspetiva do indivíduo.
Concluindo, parece-me existir uma larga diversidade de perspetivas possíveis de analisar, tendo em consideração os estudos existentes, no que ao aumento da criminalidade diz respeito. Existem vários fatores a serem explorados, como o sentimento de insegurança e a sua natureza e o próprio aumento do crime, pelo que existe cada vez mais a necessidade de existirem equipas especializadas a estudar este/s fenómeno/s.
Maria João Pereira
Departamento Fazer Pensar
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