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Foto do escritorDiana C. S.

A CRISE DAS NOSSAS VIDAS

São inegáveis as consequências visíveis e invisíveis que a pandemia trouxe para as nossas vidas. O vírus da COVID-19 assolou o mundo, mergulhando-o numa crise nunca antes vivida. A humanidade atravessou um período conturbado, mas a tão desejada luz ao fundo do túnel apareceu! A milagrosa vacina por que tanto ansiávamos fez regressar as cores ao filme a preto e branco que, repetidamente, vivenciávamos. Regressou a esperança e o sonho pelo tão desejado “normal” nunca parecera tão perto de ser alcançado.


Esta luz que tem iluminado os nossos dias parece, contudo, cada vez mais ténue. A Europa volta a ser o epicentro da pandemia, trazendo novas restrições e com estas, chega a revolta daqueles que se veem envoltos num ciclo vicioso, num vaivém desenfreado e sem rumo.


Posto isto, há questões que nos aniquilam o pensamento, lutando por uma resposta. Será que a Sars-Cov 2 também “infetou” os tão proclamados Direitos Humanos? Estarão os Governos dos Estados Europeus, momentaneamente, esquecidos da Convenção Europeia dos Direitos do Homem? Estará, de acordo com as Constituições dos Estados Europeus, a diferenciação entre vacinados e não vacinados?


Estas questões já tinham lavrado nos meios de comunicação social, com o surgimento do certificado de vacinação. Mas atualmente, mais do que a exigência de um certificado de vacinação ou de um teste negativo, as discriminações e desvantagens para com a população não vacinada são altamente atrozes. Tomemos como exemplos a Dinamarca, que impõe o certificado de vacinação obrigatória para entrar em bares e restaurantes; a Itália, que exige certificado obrigatório para atividades de lazer; a República Checa, que avança com o confinamento para não vacinados, e a Áustria, que determinou a vacinação obrigatória.


Apesar da Áustria ser o primeiro país da União Europeia a adotar a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19 para toda a população, com imposição de sanções a quem não o fizer, a adoção de medidas restritivas, como a exigência de um certificado de vacinação, e a limitação da liberdade de movimento e deslocação da população dos não vacinados não é nada mais, nada menos do que a imposição da própria vacinação obrigatória. De facto, a questão é complexa e devemos refletir sobre ela, uma vez que está em causa a ponderação de valores ou bens jurídicos constitucionalmente protegidos em iminente colisão: por um lado, a liberdade individual, a inviolabilidade da pessoa e do corpo e o respeito pela integridade física; por outro, a proteção e preservação da saúde individual e da comunidade. A resolução deste conflito só se poderá fazer à luz de uma ponderação de uns e outros valores, à luz de critérios de proporcionalidade, de razoabilidade e de adequação aos objetivos prosseguidos pela vacinação.


É indubitável a distinção entre pessoas vacinadas e não vacinadas. Cumpre-nos, agora, questionar se essa distinção não constituirá em termos de direitos humanos e liberdades uma violação dos mesmos.


Esta diferenciação tem gerado, no velho continente, o agravamento da incerteza quanto ao futuro, ansiedade, depressão, revolta, desânimo e o descrédito quanto aos próprios direitos. Aos olhos de todos, a distinção entre pessoas vacinadas e não vacinadas gera uma polarização da sociedade, agrava as tensões e conduz a atos de discriminações.


De facto, todo este panorama faz-nos repensar que a realidade que conhecemos pode mudar em horas, minutos ou mesmo segundos. Nada pode ser tomado como garantido, seguro ou infindável. E para fazer tal juízo de valor o mais comum dos homens nos basta. Não são necessários conhecimentos especializados para observar a realidade que nos rodeia e questionar com a maior das simplicidades: onde estás tu, Princípio da Igualdade? Como tem andado então o Direito à Liberdade? E o que é feito do Juízo de Proporcionalidade?


Aos meus caros leitores talvez estas perguntas tenham feito surgir uma certa estranheza devido a um tratamento tão próximo e amigável para com os Direitos humanos. A verdade é que o hábito de os ter tão presentes na nossa vida torna-nos descuidados. E é sempre importante relembrar que os devemos zelar e, acima de tudo, refletir sobre o caminho percorrido. Sim, esse mesmo caminho tortuoso, cruel e difícil que nos trouxe ao tão ambicionado, mas ainda jovem Estado de Direito Democrático.


E de um momento para o outro, vivemos em primeira mão tudo aquilo que aprendemos nos velhos livros de história. Uma história não muito longínqua, cada vez mais real nos dias que correm. O mundo está a tornar-se mais autoritário e os governos democráticos estão a retroceder, recorrendo a práticas repressivas e enfraquecendo o Estado de Direito.


Esta realidade não é recente, e nem sequer nos podemos considerar surpreendidos com este recuo. Mas a verdade é que a pandemia veio tirar a prova dos nove e o resultado foi claro: o declínio democrático.


Resta-nos saber: será esta apenas uma página sombria da história ou ainda temos um negro capítulo por conhecer?

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