Sobre a saúde mental nos estudantes universitários
A norma social diz-nos que os anos universitários são dos melhores que iremos viver. A estadia de cada um na faculdade pode, de facto, transformar-se num fornecimento contínuo de boas memórias, diversões e sentimentos que carregaremos sempre junto ao coração. Não deixa por isso de ser, no entanto, uma das fases mais vulneráveis para a mente humana. Alta pressão, fadiga, isolamento, expectativas irrealistas, competição, são todos fenómenos pelos quais a maioria dos estudantes universitários passa. Aliando tudo isto às circunstâncias atuais do mundo, desde os estragos provocados pela pandemia na educação, à ansiedade que a nova guerra na Europa deixa em muitos, os problemas na saúde mental dos jovens têm vindo a atingir níveis nunca antes vistos.
O mundo pareceu estagnar durante as inúmeras quarentenas e isolamentos a que a pandemia nos obrigou. Todos os outros problemas de saúde foram inevitavelmente deixados para segundo plano. Todavia, isto gerou o que foi apenas uma calma aparente que precedeu uma tempestade de doenças mentais nos jovens universitários. Segundo um estudo conduzido pelo Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, quase metade dos universitários acompanhados demonstraram sintomas de depressão moderada a grave durante a pandemia. É importante salientar que os instrumentos utilizados pela investigação não podem estabelecer um diagnóstico concreto, apenas detetar sintomas. Assim, este estudo chegou à conclusão de que a sintomatologia associada a doenças como depressão e ansiedade nos jovens teve um aumento substancial ao longo do primeiro ano de Covid-19. Contudo, tal aumento não foi acompanhado por uma maior procura de ajuda profissional. Pelo contrário, mais de 50 % dos jovens com sintomas de depressão e ansiedade moderada ou grave não recorreram a qualquer tipo de tratamento.
Estes dados revelam-se particularmente preocupantes, uma vez que este é um grupo de risco – 75% das patologias mentais têm um primeiro episódio antes do sujeito atingir os 25 anos. Segundo o American College Health Association, a depressão, ansiedade, adição, distúrbios alimentares e o suicídio são os desafios psicológicos com os quais os jovens universitários mais se debatem.
Um outro estudo denominado “Reflexos da Covid-19 na saúde mental de estudantes universitários” mostrou que os problemas mentais incentivados pela pandemia foram mais sentidos pelas mulheres e pelos estudantes dos primeiros anos de licenciatura das áreas de Direito, Ciências Sociais e Serviços. Estes resultados colocam a FDUP e os seus estudantes na linha vermelha. Para muitos dos nossos colegas, os anos da pandemia foram extremamente difíceis, e a ansiedade provocada pela atual guerra na Ucrânia apenas agrava o problema.
Um outro obstáculo que se coloca é a difícil acessibilidade a atendimento psicológico de qualidade pela classe estudantil, que normalmente tem menos rendimentos do que a média. Segundo o website “Deco Proteste”, a maioria das clínicas e consultórios privados não têm qualquer tipo de acordos ou comparticipações, e a média do preço de uma primeira consulta de psicologia nos estabelecimentos averiguados ronda os 60€. Assim, havendo uma premente necessidade de fornecer ajuda psicológica de forma acessível aos universitários, os Serviços de Ação Social da Universidade do Porto (SASUP) desenvolveram uma rede de apoio psicológica, que oferece aos estudantes da Universidade a possibilidade de receber consultas de psicologia por um valor normal de 2,50€ (note-se que durante o período pandémico o pagamento de tais consultas foi suspenso). Para além de psicologia, existe ainda todo um leque de especialidades variadas oferecidas por estes Serviços, a nomear psiquiatria e saúde sexual, todas a preços mais acessíveis que a média. Os alunos da FDUP que recorreram a estes serviços realçam a qualidade das consultas e do atendimento, apesar de referirem que, por vezes, o tempo de espera se revela mais prolongado que o expectável. No entanto, reitera a opinião geral de que estes serviços são extremamente importantes e que fazem um bom trabalho dentro das suas capacidades.
Em suma, até agora esta década não tem sido fácil de navegar, muito menos por jovens que, estatisticamente, já se encontravam numa fase de maior vulnerabilidade mental do que a média. Mais do que nunca, é importante agora reafirmar a importância da saúde mental e investir em soluções de qualidade e acessíveis para todos, pois cada vez mais os efeitos desta epidemia silenciosa fazem-se ouvir pelas piores razões.
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