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Foto do escritorJoana Martins da Silva

A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO PCP

“Nobody in the world, nobody in history, has ever gotten their freedom by appealing to the moral sense of the people who were oppressing them.”- Assata Shakur


PCP não apoia guerra na Ucrânia, nem Vladimir Putin, mas no comício dos 101 anos do partido, os comunistas vaiaram Jerónimo de Sousa quando este se referiu aos Estados Unidos, mas não quando falou da Rússia. Pequenos pormenores que explicam os subterfúgios linguísticos dos últimos dias com comunicados e tweets com chorrilhos de verdades alternativas para consumo interno do partido.


“O PCP condena o caminho de ingerência, de violência e de confrontação decorrente do golpe de estado de 2014 promovido pelos EUA na Ucrânia, a que se seguiu a recente intervenção militar da Rússia, e a que se acrescenta a intensificação da escalada belicista dos EUA, da NATO e da UE. São urgentes iniciativas e medidas que abram caminho à negociação e à paz” - Comunicado de 1 de março do Gabinete de Imprensa dos deputados do PCP no PE.


Para o PCP os grandes responsáveis pelo conflito já estão definidos: “as sucessivas decisões e provocações dos EUA, NATO e UE que levaram ao conflito na Ucrânia e precederam a intervenção militar da Rússia neste país”. Não esquecendo também o papel da vítima: “o regime xenófobo e belicista instaurado na Ucrânia na sequência do golpe de Estado de 2014 e que envolveu o recurso a grupos fascistas”. Nada que não seja de estranhar. Quando é para falar da Ucrânia, o PCP já sabe distinguir democracia de não democracia (exceto quando é para caracterizar o regime da Coreia do Norte, aí “primeiro tínhamos de discutir o que é a democracia", como dizia Jerónimo de Sousa).


A quem aproveita a guerra? Desde logo, não servirá os ucranianos, mas o PCP tem já uma resposta na ponta da língua: “serve, sim, a administração norte-americana e o seu complexo militar-industrial, para vender armas e para se aproveitar económica e militarmente de uma guerra a milhares de quilómetros”. Se não serve Putin, então porque é que invadiu? Foi obrigado? A Rússia também não lucra com a venda de armamento, apenas os Estados Unidos?


O problema da posição do PCP não é alertar para a proliferação da extrema-direita nazi na Ucrânia (que existe e não deve ser ignorada), mas sim a necessidade constante de recorrer a “revisionismos” históricos, disfarçados de “contextualização”, que beneficiam a sua narrativa anti-imperialista americana, anti-NATO e anti-UE. Um sectarismo ideológico entrincheirado e completamente alienado da realidade. Uma consistência e ortodoxia auto-destrutiva que mina todo um legado do combate antifascista, sindicalista e trabalhista. Afinal, o Povo é quem mais ordena, exceto se não estiver do lado dos interesses do PCP.


Os comunistas têm uma visão verdadeiramente holística do conflito: “Lutar contra a escalada de confrontação, as agressões e as ingerências do imperialismo contra o alargamento da NATO e a sua dissolução, contra a militarização da UE, pelo fim das sanções e dos bloqueios, pela paz e desarmamento no mundo, pelo fim das armas nucleares, pelo respeito dos direitos e da soberania dos povos”.


Será que a resistência da Ucrânia para o PCP será uma “escalada armamentista”? Fique claro desde logo que exigir um cessar-fogo ou uma solução de paz não significa “apoiar a Rússia”, mas perante a ausência de escrúpulos de um autocrata que pretende a total capitulação da Ucrânia, que não respeita corredores humanitários, que atinge civis e exige a aceitação incondicional de todas as suas condições, os caminhos da paz estreitam-se. As negociações não adiantarão muito. E impedir o armamento da Ucrânia também não é solução. Somos todos anti-guerra até sentirmos o nosso mundo ameaçado. Não reagir perante um ataque bélico e militar à soberania de um Estado não é pacifismo, é cumplicidade. O que não invalida que a resposta tenha de ser ponderada.


Críticas como esta renderam a acusação de “anticomunismo primário” por parte de muitos militantes do partido comunista. A dificuldade de muitos em lidar com contraditório é muito reveladora dos tempos que correm, em que qualquer crítica surge como uma “micro-agressão”. Tempos estranhos.


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