As páginas deste Jornal circulam pela Casa Amarela da Rua dos Bragas (vamos todos ignorar o facto de nem sempre assim ter sido) há 25 anos. É uma idade notável, que transporta consigo o peso de uma tradição e das palavras de por quem aqui passou. Às centenas de redatores, diretores, colaboradores, cronistas, Professores que por aqui quiseram deixar uma marca, que se eternizaram nas letras pequeninas agora depositadas na Biblioteca Professor Doutor Jorge Ribeiro de Faria, dedicamos as palavras que agora escrevemos, para comemorar esta data redonda. Tribuna, estás crescido – e tem sido bom crescer contigo.
Em dezembro de 1997, publicava-se a primeira edição de sempre do Tribuna, com o artigo “Porto: património da Humanidade” a inaugurar o espaço destinado à Cultura – um hino à nossa Invicta sob a forma de roteiro cultural da cidade. Começava a jornada do departamento que em 25 anos escreveria tanto sobre património, cinema, teatro, música, literatura e dança, como de poesia, humor, rádio, cartoon e viagem.
“Ficar sonhando…/Sonhando com um ficar diferente/ Diferente de toda a gente/ Da gente que sonha/ Da gente que fica […]” – estes são versos da antiga estudante Sónia Mendes num poema de uma das primeiras edições, intitulado “Ent(r)e”, que integrou o primeiro espaço do Jornal exclusivamente destinado à poesia; palavras que parecem definir o espírito da redação do Tribuna ao longo do tempo, quase sempre procurando a diferença e raramente o “lugar comum”. Mais tarde, surge a par da poesia a criação literária, uma tradição que se manteria essencialmente até ao início dos anos 2000. Nestes ramos culturais, sobressaem ainda as entrevistas aos escritores Valter Hugo Mãe, em 2009, e Gonçalo M. Tavares, em 2012.
Em maio de 1998, foi altura de dar mais palco (e páginas) ao Departamento, avançando-se com escolhas inéditas – para além de um conto policial e de um espaço para críticas culturais nas mais variadas áreas, realiza-se uma interessante fotorreportagem do “Porto Cartoon World Festival”, e investiga-se sobre “Os inícios do humor português”. Em destaque nesta edição consta ainda um comentário literário da Professora Doutora Luísa Neto, intitulado “O livro da minha vida”, que explora a obra Silêncio para 4, de Ruben A., com uma breve referência ao Para sempre, de Virgílio Ferreira.
Quanto à sétima arte, esta foi sendo sempre uma área predileta dos redatores, destacando-se de entre as inúmeras linhas escritas: a composição de uma biografia de Hitchcock (maio de 2000); as várias referências ao Fantasporto, Festival Internacional de Cinema Fantástico que se mantém em 2023; uma análise sobre o futuro e presente do cinema no Porto – “O Cinema no Porto: que futuro hoje?” –; a entrevista ao realizador Manoel de Oliveira (dezembro de 2008), bem como a publicitação do cineclube da Faculdade (criado em 2006/2007). Será ainda de notar o artigo de opinião «Os trópicos do “eu”» de 2009, escrito por Francisco Noronha, alumni da FDUP que, curiosamente, se tornou realizador de cinema, tendo correalizado o aclamado documentário Não Consegues Criar o Mundo Duas Vezes (2017).
No campo musical, para além das clássicas críticas que foram povoando as várias edições, ficaram para a história do Tribuna três entrevistas a grandes nomes da música nacional: Pedro Abrunhosa, em maio de 2001, Manuela Azevedo, vocalista dos Clã, em dezembro de 2002 e Manuel Cruz, vocalista dos Ornatos Violeta, em dezembro de 2009. Em abril de 2015, o Cultural aventurava-se pelo mundo da música clássica, com uma entrevista ao tenor José de Eça, explorando a suposta característica elitista associada a este género musical, bem como as suas dificuldades em Portugal. Na verdade, já em 2009 se havia recomendado um espetáculo dos ilustres pianistas Mário Laginha e Bernardo Sassetti.
Quanto à dança, este é um tópico que só é introduzido em edições mais recentes, tendo merecido destaque especial na edição de dezembro de 2012 com o artigo “Dança Contemporânea - A Dança do Nosso Tempo” - uma ode a este estilo de dança nascido na década de 60, que na sua raiz se caracteriza pelo “pé descalço”, pelo contacto com o chão e pela neutralização dos papéis de género.
Entretanto desponta uma rúbrica, um tanto original, de nome “errâncias”, destinada ao relato de viagens dos redatores do Departamento a várias regiões do país, com direito a registo fotográfico. Desde Cinfães a Santa Cruz do Douro (Baião), terra natal de Eça de Queirós, as rotas percorridas deixaram marcas nos viajantes, que por vezes o expressavam em jeito de prosa poética – «Como o soldado chamado à pátria ou o presidiário recém-libertado, inundava-os toda uma torrente de sensações difusas, de um primarismo que lhes sabia bem ao gosto, a que, humildemente, podiam chamar “liberdade”…» (excerto redigido pelo então estudante Professor Doutor Tiago Ramalho numa edição de 2009).
Às artes plásticas, o Tribuna foi dedicando alguma atenção: em 2013 escrevia-se sobre a influência portuguesa na arte oriental e, no ano seguinte, o Departamento Cultural dedicou o seu espaço na edição final a uma reflexão tripartida sobre “Arte e tecnologia”, na qual se falava do então recente Google Art Project e ainda das “obras transgenéricas” do artista Eduardo Kac. Não será também de esquecer a entrevista a Joana Vasconcelos, em maio de 2013, ano em que a artista representaria Portugal na bienal de Veneza.
Ao longo dos seus 25 anos, uma das principais linhas orientadoras e criativas que o Tribuna optou por seguir foi a ligação com a Invicta – ou não tivesse sido esse o tema a inaugurar o Espaço Cultural do Tribuna, em 1997!. Já em dezembro de 2000, explorava-se na Edição Final o marco na história da nossa cidade que se planeava para o ano seguinte (2001): Porto, capital europeia da cultura. O tema estendeu-se para as edições de maio (“Porto 2001: Três Meses de Cultura”) e de dezembro de 2001 (“Porto 2001 – Música no Porto em 2001”).
Para além disso, complementando o “Roteiro Cultural do Porto” elaborado na primeiríssima edição deste Jornal (tema que voltaria a ser nosso conhecido, na Edição Final de 2022), em dezembro de 2010 escrevia-se no tribuna sobre os “Heróis no Silêncio”, isto é, sobre figuras que fazem parte do imaginário da cidade mas cuja história era então (e continuará hoje a ser) desconhecida pela maioria. São eles Passos Manuel, o “Homem do Leme” e Diogo Cão, entre outros.
Paralelamente, a ligação à Academia, nas suas variadas frentes, foi também um tema privilegiado. Na primeira edição, divulga-se no Tribuna a abertura da livraria da AEFDUP. Em 2002, a Semana de Direito da FDUP e, dez anos volvidos, a Academia Política Apartidária (“Um projeto que nasce”) e ainda os 25 anos do programa Erasmus.
Não deixa de ser interessante a reflexão que decorre desta “visão panorâmica” do Tribuna, ao longo dos últimos 25 anos. No que à redação do Departamento Cultural diz respeito, conseguimos ver que obras marcaram várias gerações (a nossa incluída) e quais caíram no esquecimento. Em 1999, recomendava-se Todo sobre mi madre de Pedro Almodóvar, de que hoje tanto se fala. Em 2009, entrevistava-se Valter Hugo Mãe e, em 2013, recomendava-se a leitura de Clarice Lispector. Como é interessante assistir à consagração da intemporalidade!
Para além disso, o Tribuna, como projeto de alunos para alunos, também é orientado pelos interesses dos redatores em cada ano. Assim, assistimos no Tribuna a um período de tempo em que se escreve mais sobre Humor, a um período em que se escreve mais sobre Banda Desenhada ou até a um período em que se escreve sobre Xadrez. Os alunos-redatores deste Jornal deixam nele vestígios dos seus interesses e da sua juventude para a posteridade. Quem vai ler os nossos artigos daqui a 25 anos? O que irão achar? Será que, em 2048, os nomes Richard Zimler, Miley Cyrus ou Elena Ferrante ainda dizem alguma coisa a quem nos lê?
Vinte e cinco anos volvidos, já muito se fez, escreveu, experienciou e imaginou nestas páginas físicas e virtuais que juntas formam o Tribuna – também essa evolução é sinal do tempo e da História que já carregamos. Esta foi a nossa singela homenagem a todos os que dela fizeram (e fazem) parte, em especial, aos tribunos-culturais que vieram antes de nós…
Parabéns, Tribuna! E venham mais vinte e cinco: que sejas também tu intemporal.
Clara Castro, Ana Neri Moreira & Martina Pereira
Departamento Cultural
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