Casa dos Bragas, 2022.
As janelas estremecem de harmonias eólicas, chove e o escurecimento é latente.
Há, simultaneamente, mais sombra e menos sombras. Começará a última aula do dia.
Este texto direciona-se ao aluno que ainda vai a tempo e ao recém-caloiro que ainda não se predispôs. Afinal, a sina do Homem é habituar-se. Já David Hume diria que esse é o guia da vida; a forma empírica como relacionamos causalmente o mundo e, reflexamente, nós mesmos.
Um uso para o qual cedo se desliza na nossa academia é a abstinência crónica comprovada à frequência de aulas… E que tipo de formandos em ensino jurídico seríamos se não apelássemos ao famoso contraditório nessa conformação intergeracional?
O estudante universitário é uma peça em movimento, tanto o transeunte dos carris, como o deambulante da rodovia, e, portanto, despende o seu tempo com base numa instrumentalizada relação custo-benefício, não necessariamente vinculado a um rígido sentimento de realização.
Então, muitas condicionantes nos são impostas, mas muitas outras nós criamos, havendo uma resignação ao mínimo, que nem “determinístico-liberais” que somos.
Ironicamente, também foi na Escola que aprendemos, por um conhecido vosso, que ”o Homem sonha, a obra nasce”, um trágico pseudocorolário do princípio da autodeterminação da pessoa. Ergo, pode ser de rejeitar esse utilitarismo inerente à falta de assiduidade.
Um dos pressupostos dessa praticidade é que os livros canónicos recomendados, como implícito na sua designação socioconstrutivista, tudo influenciam, tornando subsidiária a comparência escolar.
Curioso é que é este mesmo raciocínio que justifica o exato comparecimento: O Professor é viva prova da continuidade histórica, da partilha de saberes, indo de igual forma influenciar “milhentos” discípulos no seu caminho, certamente mais in concreto.
A outra pressuposição é que se está num estado de sujeição à mera visualização de uma palestra.
Ora, o ensino, como todas as artes, transmuta-se. Atualmente, é uma atividade bilateral. O aluno é incentivado à interação com o Professor. Esse dinamismo evoca confiança e promove a secundarização daquela ideia simbólica do Professor como figura inalcançável, em nome de uma aproximação à sua personalidade e mundividência, necessariamente impregnadas com o tipo de associações epistemológicas que, no fundo, enquanto expectáveis licenciados, devemos aprender, com um sentido de realização pessoal ao fazê-lo.
É difícil mas, com tentativa e erro, esse caos primordial sentido no participar na sala de aula pode desvanecer. E, ainda que se admitam aulas mais academicamente saturadas, o que não há para adorar nas alegrias e batalhas da trincheira.
Aludindo, de novo, ao estudante deslocado, o cansaço é um fator a considerar.
É exigido que o estudante lide com estímulos de satisfação que se propagam vagarosamente no tempo, em detrimento de satisfações mais imediatas, algo de estranha conciliação para o sistema neurológico de recompensa. É mais convidativo não comparecer no estritamente não necessário, porém a imperfeita tentativa de forjar uma força de vontade superior ao que constitui um verdadeiro teste do quotidiano cria disciplina, a mãe da invenção.
Todo o aluno vai a tempo de mudar as pequenas ações que compõem o seu guia de vida, mesmo aquele com sedimentadas idiossincrasias, não fosse o que o Humano faz em busca do carpe diem englobante de si mesmo. E esse mesmo ideal de eficiência, de aproveitamento, é algo sempre a ponderar, não esquecendo as inerentes responsabilidades que advêm do alcançado ingresso no ensino universitário.
José Pedro Carvalho
Mundo Universitário
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