Casa para morar?
- Filipa Santos

- há 4 dias
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A última década tem sido caracterizada pelo aumento significativo dos preços de aquisição e arrendamento de habitação, em muito superiores ao salário médio, afetando particularmente os jovens europeus.
Em Portugal vive-se a pior crise de habitação alguma vez vista. Desde o pior acesso a habitação de entre os 30 países analisados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, ao crescimento dos preços da habitação acima do ritmo salarial, surgem questões sobre as causas da crise deste setor em Portugal.
Com o aumento exponencial de preços − em quatro vezes superior ao salário médio −, a crise de acessibilidade habitacional cria barreiras para jovens portugueses de classe média, fazendo da aquisição imobiliária um grande desafio para o qual não parece haver quaisquer justificações, uma vez que não se consegue relacionar a evolução de indicadores económicos − como o PIB −, salários e emprego e a evolução dos preços do mercado imobiliário, sendo estas barreiras a este mercado prejudiciais para o desenvolvimento do país.
Em primeiro lugar, o aumento dos preços da habitação, quer na compra, quer no arrendamento, reduzem o rendimento disponível das famílias. Apesar do crescimento salarial da década de 2013 a 2023 ter sido de 30%, o aumento do valor mediano da renda nos novos contratos de arrendamento − aumento de 64% desde 2017 − e o aumento dos custos de habitação fazem com que o crescimento salarial seja depauperado, não resultando, por isso, em ganhos salariais reais.
Em segundo lugar, as gerações mais jovens, que entraram no mercado de trabalho ao longo da última década, são particularmente penalizadas pelo aumento das rendas de habitação, limitando a sua capacidade de emancipação, o que os leva a sair da casa dos pais cada vez mais tarde. Segundo o Eurostat, a idade média de saída dos jovens da casa dos pais em Portugal é de 29 anos, o sétimo valor mais alto dos Estados-Membros da União Europeia.
Estas barreiras indicam ainda uma maior redução da igualdade de oportunidade e um aumento de desigualdades sociais, na medida em que criam entraves às migrações internas, privilegiando o acesso aos mercados de trabalho regionais mais dinâmicos a quem é natural dessas áreas, e dificultando o acesso ao ensino superior com o aumento dos preços dos quartos para estudantes nos maiores centros urbanos.
Esta inacessibilidade habitacional leva ainda à fuga de cérebros e ao desperdício de décadas de investimento na educação superior, limitando a força de trabalho portuguesa, uma vez que, para além do constrangimento à mobilidade interna do país, estes custos habitacionais mais elevados levam a uma maior pressão salarial, diminuindo o nível de vida dos trabalhadores, que vão procurar estabilidade no estrangeiro.
Para além disto, a crise habitacional cria obstáculos às empresas que, consequência do elevado preço imobiliário, aumentam os custos de produção, o que causa quebras na competitividade e impede a competição de empresas nacionais em mercados globais, limitando a capacidade produtiva e inovação das mesmas.
Para além das consequências sociais diretas, o aumento dos custos imobiliários cria entraves à criação de um tecido empresarial inovador, dinâmico e produtivo, impulsiona o brain drain, e pode ter graves consequências que comprometem o modelo de desenvolvimento nacional.
Filipa Santos
Departamento Sociedade





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