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Cheira a anos trinta

  • Foto do escritor: Filipa Santos
    Filipa Santos
  • 8 de abr.
  • 6 min de leitura

Atualmente, os tópicos mais abordados pelos noticiários são a guerra, a ascensão do populismo, a crise económica e o panorama geopolítico, que lembra o período antecedente à Segunda Guerra Mundial (1939-1945).


Para compreender esta comparação, é necessário contextualizar brevemente o período anterior à Segunda Grande Guerra, período esse de grande crise económica consequência da Grande Depressão de 1929.



Crise Económica Global:


O período que medeia a Primeira (1914-1918) e a Segunda Guerra Mundial conhecido como o “período entre guerras” foi marcado por instabilidade económica, política e social.


A Europa encontrava-se, pela primeira vez na história, numa posição de submissão perante os Estados Unidos da América, estando inteiramente dependente destes – durante a Primeira Guerra Mundial, a Europa tornou-se o mercado mais importante para exportações americanas e necessitava urgentemente de capital norte-americano, que os bancos de Wall Street estavam preparados para oferecer, desde que as condições económicas dos países europeus fossem capazes de retornar esse capital – havia, por parte dos grandes bancos, um grande interesse em investir no “reviver das cinzas” da Europa do pós-guerra.


Em 1929, deu-se o “crash” do mercado, causado pelas ações inflacionadas, pelo crescimento dos empréstimos de bancos, pela superprodução de produtos agrícolas e pelo aumento do mercado de interesses, este colapso levou à deflação da economia norte-americana, marcando o início da Grande Depressão.


Esta crise económica alastrou-se por toda a Europa. Nos países mais afetados, entre os quais a Polónia, a Alemanha e a Áustria, uma em cada cinco pessoas encontrava-se desempregada, e, consequentemente, a produção industrial caiu em 40%, culminando no colapso do comércio internacional.


A depressão causou desemprego e pobreza em massa em todos os níveis da sociedade europeia, com a falência de bancos e de indústrias, ao mesmo tempo que a democracia no continente europeu vivia um período de grande turbulência.


Quando os políticos de fações mais moderadas falharam na introdução de medidas para combater a crise, a grande maioria da população começou a apoiar-se nos partidos que lhes ofereciam um semblante de “estabilidade” – levou ao crescimento de regimes autoritários que prometiam restaurar a ordem e resolver as crises económicas.


 

Ascensão de Regimes Totalitários:


Como já dito, os totalitarismos surgiram como consequência do descontentamento das massas europeias perante o primeiro pós-guerra.


Consequentemente, os partidos, entre os quais o Partido Nazi, na Alemanha, e o Partido Fascista, em Itália, tornaram-se mais visíveis, tanto na imprensa como nas ruas. No primeiro, o Partido Nazi aproveitou-se do crescente descontentamento causado pelo caos político e económico, tendo recorrido à propaganda. Durante campanhas eleitorais, prometeu restaurar a economia, lutar contra o desemprego, elevar o status da Alemanha, perdido na Primeira Guerra Mundial para que esta voltasse a fazer parte do prisma internacional enquanto grande potência, reconquistar território perdido na Primeira Grande Guerra e criar um Estado autoritário.


O mesmo aconteceu em Itália, com o Partido Fascista, uma vez que Benito Mussolini (primeiro ministro italiano de 1922 a 1943 e o primeiro ditador fascista da Europa do século XX) angariou apoio através da promoção da ideia de um governo forte e autoritário, apelando às massas descontentes com o estado da democracia no país, que era incapaz de combater a crise económica vigente.


Os nazis utilizaram ainda os medos e preconceitos das massas ao mobilizar uma campanha que acusava falsamente os comunistas e os judeus pelos problemas do status quo alemão. Tendo, Adolf Hitler (líder do Partido Nazi de 1920 a 1921, chanceler e Führer da Alemanha de 1933 a 1945) sido democraticamente eleito.

 


Tensões Geopolíticas:


O período entre guerras foi marcado pelo redesenhar das fronteiras internacionais e pelo surgimento de ideologias como o fascismo e nazismo.


O regime nazi invadiu a Polónia em 1939, através dos seus esforços de rearmamento e expansão territorial, consequência do descontentamento gerado pelo Tratado de Versalhes (tratado assinado no final da Primeira Guerra Mundial, pelas potências vencedoras em Versalhes, em 1919, que reduziu a população e o território Alemão em 10%, condenou a Alemanha ao pagamento de reparações de guerra e impôs várias limitações quanto ao armamento e forças militares alemãs), empunhando uma retórica de ultranacionalismo.


Por seu turno, Benito Mussolini, munido desta mesma retórica e com o desejo de recuperar a influência global da Itália, fez inúmeras campanhas militares, incluindo a invasão da Etiópia.


Estas ações foram os catalisadores da Segunda Guerra Mundial ao desafiarem a ordem global e os interesses dos Aliados (França, Reino Unido, Estados Unidos da América, URSS, China) que, confrontados com a destruição do seu continente na Primeira Guerra Mundial, tentaram a todo o custo manter a paz através de medidas de apaziguamento, como concessões e compromissos com as Potências do Eixo (Alemanha, Itália, Japão) – instigaram a eclosão da Segunda Guerra Mundial, pois, que apesar de terem sido bem intencionadas, não foram bem concretizadas.

 

Existe uma série de paralelismos entre o supramencionado e o Estado Atual do Mundo. Procede-se, portanto, à análise destes aspetos.

 


Desafios Econômicos Globais:


A pandemia de Covid-19 levou a que a grande maioria dos estados adotassem políticas de emergência para combater uma crise de saúde pública. Como consequência destas medidas, a economia global foi colocada num “coma induzido”.


Apesar de marginalmente diferente da Grande depressão, a pandemia causou contrações na produção e no emprego mais acentuadas do que as verificadas nesta última.


Esta crise económica teve efeitos especialmente severos nas potências económicas emergentes. A grande maioria das empresas e famílias foram incapazes de resistir ao choque da “hibernação da economia” – tanto em economias emergentes como em economias avançadas, mais de 50% das famílias não tinham capacidade para cobrir as despesas básicas por mais de três meses caso sofressem cortes salariais.

 


Tensões Geopolíticas Crescentes:


O período histórico correspondente à atualidade é um marcado por tensões geopolíticas.


Atente-se no caso dos Estados Unidos da América, cujas relações com a Rússia se deterioraram como consequência da administração Biden e do seu apoio à Ucrânia, relações essas que estão a ser restauradas com a segunda administração Trump, que descreditou publicamente a causa ucraniana, levando ao repúdio por parte de vários países europeus das ações do presidente norte-americano.


No contexto europeu, Ursula Von der Leyen (atual Presidente da Comissão Europeia) confirmou o apoio da União Europeia à causa ucraniana, afirmando que a Ucrânia “faz parte da família europeia”.


Ainda relativamente à administração de Donald Trump, menciona-se o anúncio, pelo Presidente, da imposição de tarifas de 25% sobre as importações canadianas e mexicanas, a imposição de tarifas de 10% quanto às importações Chinesas e a imposição de tarifas de 25% sobre as importações de automóveis.


O panorama geopolítico atual está marcado por tensões crescentes, consequência dos conflitos Rússia-Ucrânia e Israel-Palestina, assim como a ameaça de guerra comercial entre os EUA e a China. Este cenário reflete a clara disputa pela ordem mundial e pela definição das regras globais que poderão levar a uma escalada militar.



Crescimento dos movimentos populistas na europa:


Atualmente, vive-se um período de crescimento dos movimentos populistas de extrema-direita na Europa, que reciclam a retórica utilizada pelos partidos nazi e fascistas dos anos trinta, enfatizadora da necessidade de criação de um governo forte e autoritário.


Em 2016, a maioria dos britânicos votou a favor da saída do Reino Unido da União Europeia – um referendo marcado por uma campanha assente, essencialmente, em ideias populistas e desinformação.


Em França, assiste-se ao crescimento do partido de extrema direita Rassemblement National”, atualmente liderado por Marine Le Pen.


Na Alemanha, registra-se o crescimento do partido “Alternative für Deutschland”, que promove políticas de deportação forçada de imigrantes e refugiados e tem relações com grupos neonazis.


Em Itália, a primeira-ministra Giorgia Meloni foi candidata pelo partido “Fratelli d’Italia”, de ideologia fascista, sendo um partido de extrema-direita.


A história repete-se, para além da grave crise económica resultante da questão pandémica, a atual esfera geopolítica é marcada por instabilidade política, descontentamento popular, o surgimento de partidos com ideias fascizantes e guerras. A facilidade de comparação entre o “agora” e o período entre-guerras é alarmante, porque, de facto, cheira a anos trinta.

 

 

Filipa Santos

Departamento Sociedade


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