Tudo começa com a receção de um pequeno (e esperado) email: “Resultado: Colocado/a” – parabéns, oficialmente caloiro/a! E começam os (supostos) melhores anos das nossas vidas.
Este ano foi igual, sendo diferente. Depois da ânsia, chegou a confirmação de que o esforço pode ser, afinal, recompensado, espalhou-se a felicidade e a notícia pelos quatro cantos do mundo, conheceram-se os novos colegas pelas redes sociais. No entanto, devido às restrições impostas pela pandemia, já se sabia de antemão que este não seria um ano normal para os caloiros: não houve receção na Reitoria, não houve fila para as matrículas, não houve serenata nos Aliados.
O início da vida universitária nunca é fácil. Seja pela diferença de exigência em comparação com o Secundário, pelo afastamento da família ou pelas dúvidas existenciais (será que fizemos realmente a escolha certa?), o começo deste novo capítulo acarreta uma série de novos desafios que nem sempre são fáceis de superar. As inquietações, os medos e os receios são realidades que todos experienciamos, ainda que de maneiras diferentes – o choque inicial é inevitável. Afinal, it’s a whole new world!
Ser caloiro/a em 2020 é, naturalmente, sentir essas comuns dificuldades: é a matéria que acumula sem parar, é o caso prático que não conseguimos resolver, é a bibliografia que nos dá um nó no cérebro. Mas também é ter que atravessar outras que, em anos “normais”, não seriam esperadas. A pandemia ensinou-nos a sorrir com os olhos e a substituir o nosso aperto de mão pelo toque do cotovelo. Aos caloiros (e, no fundo, aos restantes Universitários), ensinou, fundamentalmente, a trabalhar com o Zoom e a valorizar as ferramentas do digital – nunca os grupos do Whatsapp foram tão importantes!
Ainda assim, há que ser honesto: para quem acabou de cruzar caminho com umas tantas centenas de pessoas, as apreciadas ferramentas digitais são curtas e não conseguem substituir (nem assemelhar-se) o contacto presencial e físico a que estávamos habituados e que, em circunstâncias normais, teríamos.
Para muitos de nós, esta não é a primeira grande “mudança de ares” – olhe-se, a título de exemplo, para a transição do Ensino Básico para o Ensino Secundário. É, no entanto, a primeira grande “mudança de ares” que acontece sem que tenhamos contacto próximo e diário com os nossos colegas. E isso faz-nos falta: o contacto do dia-a-dia faz-nos falta (reconhecendo, não obstante, que é um mal necessário – a preservação da saúde pública tem que prevalecer, como é evidente).
De modo a tentar conjugar as diferentes exigências, quer de ensino e aprendizagem, quer de cumprimento pelas normas impostas pelas autoridades de saúde, a Faculdade de Direito da Universidade do Porto adotou um sistema misto – dois dias de aulas práticas presenciais e três dias de aulas teóricas por via telemática –, que será o que podemos intitular de “best of both worlds”: a possibilidade de tropeçarmos semanalmente no edifício amarelo da Rua dos Bragas e de assistirmos a aulas com mantas em pleno outono-inverno, na companhia dos nossos apreciados animais de estimação (também conhecidos pela sua capacidade de nos fazerem perder a concentração). E, olhando para o panorama, esta é, diga-se, a melhor das soluções. Todas as semanas, temos, aproximadamente, duas horas e dez minutos, entre intervalos e horas de almoço, para conversar com os demais membros da comunidade académica presencialmente. É escasso, continua a ser difícil conhecer as pessoas (e não só por uma questão de reconhecimento facial), mas melhor que uma mão cheia de nada.
A Covid-19 resumiu a experiência universitária a duas coisas: um ecrã e uma ligação à Internet. As aulas, as reuniões, entrevistas e restantes atividades de todos os grupos académicos têm residência habitual numa qualquer plataforma de videochamadas online. As conversas com a comunidade académica podem ser encontradas em timelines do Twitter. Com sorte, haverá quem troque umas palavras através do email institucional. No fundo, tudo foi redirecionado para um pequeno retângulo preto.
Em meados de novembro, foi noticiada a possibilidade de, na renovação do estado de emergência, ser decretado o fecho das Universidades (que não se veio a verificar, com exceção dos dias 30 de novembro e 7 de dezembro), o que levaria à suspensão das atividades presenciais. Ainda que o Ministro da Ciência, Tecnologia Ensino Superior, Manuel Heitor, em posição alinhada com o presidente do principal sindicato do setor, Gonçalo Leite Velho, tenha afastado o encerramento dos estabelecimentos do Ensino Superior, a verdade é que essa possibilidade parece ter vindo dar uma nova onda de desânimo à comunidade estudantil, que já está a viver a experiência universitária pela metade.
Ainda assim, nem tudo estará a ser péssimo, certo? A tecnologia lá terá os seus defeitos e inconvenientes, mas tem-nos permitido ter algum contacto internético com a restante comunidade académica – foi assim que contactámos com os nossos colegas mais velhos, que tão generosamente nos acolheram, e que conhecemos os restantes colegas do 1º ano. E, mesmo que isto não consiga substituir o contacto presencial, é alguma coisa. Será interessante ver estes laços criados virtualmente serem transformados, quem sabe, num mundo pós-covid, em sessões de estudo na biblioteca, conversas no bar e idas à Queima das Fitas.
Agora que terminei de fazer esta pequena síntese daquilo que têm sido começos atribulados em tempos pandémicos, sobra-me tempo para deixar duas notas. A primeira dirigida aos estudantes mais velhos (que já fazem um bocadinho parte da mobília fdupiana): obrigada pela ajuda na integração e pela transmissão dos valores académicos. A segunda aos, como eu, caloiros: parabéns! Aproveitem! É o primeiro ano do resto das nossas vidas!
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