Quem pode apresentar candidaturas às Eleições Legislativas?
Os partidos políticos e as coligações de partidos políticos.
Ainda que sejam admitidos candidatos que não estejam filiados, apenas através das listas de um partido político pode um cidadão ser elegível para Deputado à Assembleia da República.
De facto, um cidadão ou uma cidadã que tenha as competências necessárias, ideias representativas de grande parte da população vê-se ainda assim obrigado a ingressar listas partidárias para fazer valer as suas ideias e valores.
No entanto, concluída a última legislatura, é impossível ignorar que existiram duas Deputadas Não Inscritas, ou seja, não representavam um partido. Como foi o seu trabalho, considerando os obstáculos que são colocados a esta figura parlamentar?
No final de janeiro de 2020, o partido Livre retirou a confiança política à Deputada Joacine Moreira após divergências ideológicas e graves falhas de comunicação. Em junho do mesmo ano, foi a vez da Deputada Cristina Rodrigues, acusando o partido PAN de a silenciar e condicionar o seu trabalho, se desvincular do partido, passando também a Deputada Não Inscrita.
Assim, as duas Deputadas perderam vários direitos (veja-se, entre vários, o artigo 71º/2 do Regimento da Assembleia da República), mas não deixaram de fazer valer os seus ideais.
Joacine Katar Moreira
Joacine Katar Moreira foi a voz mais forte a falar das bandeiras do antirracismo, dos direitos dos emigrantes e da justiça de género, não esquecendo a justiça entra nações, reforçando o debate público sobre o passado colonialista do nosso país.
Disse ao Jornal de Notícias: «Todo o meu olhar e discurso políticos incomodava, exigia mudanças significativas que afetariam todo o status quo e até as ideias da história e da identidade nacional».
Lutou por uma esquerda política mais inclusiva das minorias, como as mulheres negras, ciganas e trans, que considera ser das maiores e mais ignoradas vítimas do racismo e discriminações estruturais em Portugal. Joacine fica para a história como quem conseguiu conceder as devidas honras a Aristides de Sousa Mendes, agora simbolicamente imortalizado no Panteão Nacional.
Foi através destes e outros sucessos, assim como várias lutas que, sendo apenas uma Deputada, cumpriu a missão de trazer maior representatividade às minorias oprimidas e de questionar os dogmas do nacionalismo português.
Planeia continuar o seu ativismo e participação política fora da Assembleia, embora não avance ainda com mais informações quanto à forma em que o fará.
Cristina Rodrigues
Cristina Rodrigues foi a voz mais forte a falar da justiça entre homens e mulheres, apresentando iniciativas legislativas de qualidade em matéria de combate à violência doméstica, violência obstétrica e nunca deixando calar o debate sobre a igualdade de oportunidades na política.
«Se queremos que as pessoas se sintam representadas, temos de possibilitar que tenham assento na Assembleia da República pessoas com quem se identifiquem», defendeu junto do Observador.
Quando questionada pelo Jornal Tribuna, faz uma avaliação positiva do seu mandato, destacando os programas de saída para a prostituição, a criminalização da partilha não consentida de conteúdos íntimos, a proposta de reconversão de praças de touros em equipamentos desportivos ou culturais, a proibição de «terapias de conversão». Destacam-se ainda recomendações, por exemplo, quanto à criação de alas específicas em caso de perda gestacional e melhoria da educação sexual nas escolas e a distribuição gratuita de produtos menstruais a jovens e pessoas em situação de carência.
Assinala o facto de o Regimento da AR ter sido alterado quando duas mulheres se tornaram Deputadas Não Inscritas, tendo existido um regime mais favorável na legislatura anterior quando Paulo Trigo Pereira passou pela mesma situação.
Apesar da qualidade do trabalho desenvolvido e dos resultados alcançados, apesar das adversidades, afirma que recebeu inúmeros comentários machistas, mensagens de índole sexual nas redes sociais, incluindo ameaças de violação – não sendo a única Deputada a viver o descrito pesadelo.
Redes sociais estas na qual teve uma presença notável, assim como Joacine Katar Moreira, procurando não só alcançar mais audiências com a sua palavra, mas também cumprindo com um dever que tem como seu: explicar-se perante as pessoas que representa. Enquanto Joacine representa visões mais polarizadoras, mas não por isso menos importantes, a conta do Twitter da Deputada Cristina Rodrigues revelou-se um espaço de entendimento e compreensão mútua entre cidadãos de esquerda e direita em torno de temas importantes como o clima, os direitos dos animais e a justiça de género.
Considera que uma alteração no sistema eleitoral poderia aproximar as pessoas da política, combatendo o desinteresse e a abstenção, afirmando que seria provável uma candidatura da sua parte às Legislativas de 2022 se tal fosse possível sem a necessidade de recorrer a uma plataforma partidária.
Apela à participação dos jovens na política, através de diversas ferramentas cívicas, partidárias ou não, e diz que continuará ativa nas redes sociais, promovendo o ativismo que já era seu antes de entrar na Assembleia da República e nunca deixará de ser.
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