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  • Foto do escritorBernardo Pinho

Eleições Legislativas: Aliança Democrática

Quatro décadas depois, a Aliança Democrática (AD) está de regresso, e a imagem embutida dos três grandes líderes que a compunham - Sá Carneiro (PSD), Freitas do Amaral (CDS-PP) e Ribeiro Telles (PPM) - é recuperada pelo PSD, num momento em que se apresenta ligeiramente à frente do Partido Socialista (PS) nas sondagens, ou pelo menos em empate técnico.


A liderança da antiga Aliança Democrática, coligação entre o Partido Social Democrata (PSD), Centro Democrático Social – Partido Popular (CDS-PP) e Partido Popular Monárquico (PPM), era uma constelação de figuras de elevada craveira intelectual. 

Por seu lado, Ribeiro Telles era um arquiteto com larga visão, especificamente ecológica. Idealizou a criação do corredor verde que atravessa Lisboa, da Avenida da Liberdade ao Parque de Monsanto, e outras iniciativas generalizadas de ordenamento do território e criação de reservas nacionais. Relativamente a Freitas do Amaral, este foi um grande jurista, e para além de fundar o CDS-PP, foi uma figura relevante na direita portuguesa, ao lado de Sá Carneiro, assumindo vários cargos.


Mas Sá Carneiro foi o principal impulsionador da Aliança Democrática. A Aliança Democrática foi fundada em 1979 e durou até 1983, vencendo com maioria absoluta as eleições de 1979 e 1980, e está inseparavelmente ligada ao contexto em que surge, o pós-PREC (Processo Revolucionário em Curso).


No período do PREC, refletido na Constituição de 1976, a expressão que ainda atualmente temos no preâmbulo da Constituição, a de “abrir caminho para uma sociedade socialista”, não era o apêndice histórico que é hoje, era uma delineação real e intencional. Portugal era uma democracia no “caminho para uma sociedade socialista”. E, se nesse caminho, o PCP e os outros movimentos de esquerda eram um acelerador, e o PS uma embraiagem, que ora continha, ora acompanhava os ímpetos da esquerda, o PSD, especificamente através da voz de Sá Carneiro, foi um travão.


Naturalmente, devido à recente ditadura conservadora, vivia-se um momento de grande entusiasmo com a esquerda (a coligação do PCP obteve o seu maior resultado (quase 19%) nas eleições de 1979, que a AD venceu com maioria absoluta), e a direita que tinha convivido com o regime estava marginalizada pelo eleitorado português.


Por isso é que o papel de Sá Carneiro, como fundador do PPD (PSD), foi crucial, assumindo-se solidamente como social-democrata, satisfazendo as pretensões do povo português, de democracia, justiça social, liberdade, mas temperando pretensões mais longínquas de, realmente, “abrir caminho ao socialismo”. Foram recompensados com duas maiorias absolutas, e nesse período tiveram uma governação eficiente, conseguindo reverter as manifestações mais emblemáticas da visão do período do PREC, reformando o país, revertendo nacionalizações, introduzindo a revisão constitucional de 1982 que removeu muita “carga ideológica” da CRP e, entre outras coisas, trabalhando para a ingressão de Portugal na Comunidade Económica Europeia (CEE).


É, então, este contexto histórico e crucial legado para a direita portuguesa que Luís Montenegro invoca quando recupera a designação “Aliança Democrática”, em coligação com Nuno Melo do CDS-PP e Rodrigo Câmara Pereira do PPM.


Luís Montenegro é o atual presidente do PSD, após a demissão de Rui Rio em 2022, contra o qual perdeu as eleições à liderança do partido em 2020. Teve um papel determinante de apoio ao governo de Passos Coelho de 2011 como líder do grupo parlamentar do PSD, mantendo-se neste cargo até 2017.


Comparativamente a Rui Rio, é marcadamente mais neoliberal, mais próximo do “Passismo” (de Passos Coelho) do que da social-democracia originária de Sá Carneiro. No seu programa, por exemplo, defende a redução simples do IRC para todas as empresas, progressivamente, até 15% em 2028; a redução do IRS para todos; e a redução do IVA para 6% em qualquer tipo de construção, incluindo, nomeadamente, apartamentos de luxo. Defende também propostas socialmente mais cirúrgicas, como o alargamento do IRS jovem até aos 35 anos e o Complemento Solidário para Idosos que lhes garante uma equiparação da pensão ao salário mínimo nacional. Mas a estratégia de fundo alinhavada é convincentemente neoliberal: baixar a carga fiscal de forma generalizada, de modo a estimular o investimento e a produtividade (está também previsto no programa uma isenção do IRS sobre prémios de desempenho e redução das taxas marginais de IRS até ao 8º escalão), e, esperançosamente, alavancar um cenário macroeconómico (que delineiam no seu programa) que gere um crescimento de 3% ao ano, a chegar a 3,5% em 2028 e, se os portugueses renovarem a confiança depositada na AD, a beirar os 4% em 2032.


A AD chega a estas eleições antecipadas relativamente bem colocada, ligeiramente à frente do PS nas sondagens ou, no mínimo, em empate técnico. No entanto, o que não é força é fraqueza, e, num momento em que a AD encontra o PS num estado de debilitante fragilidade devido à demissão do Governo e circunstâncias respetivas, esta nova AD não esboça, de todo, o elã mobilizador da antiga AD de Sá Carneiro, a capacidade de garantir uma solução governativa com uma maioria estável.


A antiga AD sinalizava uma união e um esforço de toda direita de conseguir aceder ao poder que, anteriormente, estava completamente à esquerda. De certa forma, a nova AD é muito semelhante: é uma união e um esforço de toda a direita tradicional (acompanhada pela promessa de um entendimento pós-eleitoral com a Iniciativa Liberal) para aceder ao poder, que, neste caso, estava completamente à esquerda numa maioria absoluta do PS.


Mas, segundo as sondagens, a AD não se está a descolar do PS em suficiente grau para ambicionar ou aproximar-se de uma maioria absoluta. E, nas fraquezas concorrentes de ambos os grandes partidos, o eleitorado escorre para os nichos, a exceção no pacote AD-Iniciativa Liberal: o Chega.


É uma questão massacrante para os líderes da AD, mas justifica-se, se estão ou não dispostos a fazer uma coligação com o Chega; foi a indefinição na resposta a essa questão que contribuiu, em parte, para o grande desfasamento entre as sondagens eleitorais do PSD de Rui Rio, que ameaçava derrotar o PS, e o resultado real, que foi uma maioria absoluta do Partido Socialista.


Montenegro apostou em ser mais claro nesta questão afirmando que se ganhar com maioria relativa, desafiará “todos os outros partidos a respeitarem a vontade popular e a encontrarem instrumentos no Parlamento que façam com que o Governo possa executar o seu programa, excluindo o Chega”. É uma promessa pessoal concreta, e Montenegro afirmou noutra ocasião, sobre este tema, que “vou cumprir a minha palavra”; mas a questão passa mesmo pelo facto de ser pessoal. André Ventura, por sua vez, afirmou que “se houver maioria parlamentar de direita, tenho a garantia total - não posso revelar de quem - de que haverá governo de direita; com ou sem Montenegro”. Mantém-se, então, apesar do esforço da liderança do PSD em aclarar esta questão para o eleitorado, uma indefinição nesta crucial pergunta, e a incerteza: se haverá sempre o botão de emergência, caso o “desafio a todos os outros partidos de respeitar a vontade popular” não resulte, de convocar um congresso e eleger um novo líder disposto a aceitar esta coligação com o Chega. Passos Coelho já afirmou que, sobre futuras organizações parlamentares do PSD, tal só depende “das estratégias que os partidos venham a definir, e das condições que os portugueses ofereçam aos partidos que terão a responsabilidade de governar”, e Miguel Relvas, ex-ministro do governo de Passos Coelho, afirmou no passado novembro que o “PSD pode precisar de votos do Chega para governar”.


O horizonte político de uma vitória da AD não tem nada a ver com o horizonte político de 1979 e 1980. Neste quadro, as perguntas que se impõem são duas: estará a AD disposta a abdicar de concretizar uma vitória minoritária se os partidos da oposição tradicional não a apoiarem? Ou estará disposta a eleger um novo líder que desfaz a “promessa” do atual? Resta à AD esperar por uma improvável maioria absoluta, resignar-se a novas eleições ou escolher entre as duas perguntas.


Bernardo Pinho

Departamento Sociedade

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