Nas mais recentes sondagens para as eleições legislativas do próximo dia 10 de março, o Bloco de Esquerda (BE) ronda os 5%, número próximo da percentagem de votos que o BE teve nas últimas eleições legislativas em 2019, de 4,4%. Neste artigo irá analisar-se a performance do Bloco de Esquerda desde 2019, ano de eleições legislativas em que novos atores apareceram na Assembleia da República, e que mudaram permanentemente a paisagem política portuguesa, influenciando, sem sombra de dúvida, o papel do Bloco de Esquerda no Parlamento.
As eleições legislativas de 2019 foram um ponto de viragem em Portugal. Sem dúvida que na altura não foi dada a atenção devida, mas o aparecimento destes novos atores na Assembleia da República foi o sintoma do afastamento em definitivo do panorama político português da tradição esquerdista que Portugal trazia consigo desde o 25 de abril de 1974: começou a seguir, com alguns anos de atraso, a tendência europeia de um crescimento explosivo da extrema-direita. De facto, foi em 2019 que entraram na cena política 3 novos partidos que vieram para ficar: o Livre (1,09%), a Iniciativa Liberal (1,29%) e o Chega (1,29%), todos com a representação de 1 deputado na Assembleia da República. Mas, passado 5 anos, vemos uma evolução radicalmente diferente da intenção de voto nestes 3 partidos, não sendo preciso fazer notar que a extrema direita teve um crescimento exponencial: de 1,29% para uns previstos 19% em 2024.
Mas em que é que isto influencia, então, a performance do BE nas eleições que se avizinham? Parece que, mais do que um falhanço deste em captar o eleitorado, o BE e a esquerda europeia, em geral, tornaram-se vítimas de um fenómeno que saiu fora do seu controlo. Em 2019, o BE era a terceira força política com 9,52% dos votos; em 2022, uma queda livre para 4,4% fez com que ficassem atrás da Iniciativa Liberal (IL) e do Chega e perdessem 14 deputados, passando de um grupo parlamentar de 19 deputados para um de apenas 5. Em 2024, não se prevê que haja uma recuperação substancial por parte do BE do número de deputados no parlamento. A esquerda democrática é a principal vítima das crises cíclicas do capitalismo: fazendo inúmeras cedências ao sistema capitalista, aceitando fazer parte dele, na perspetiva de reformar o capitalismo por dentro. No final, acaba por ser a ele associada e com ele definhar. Se a esquerda sempre teve como mote a defesa da classe trabalhadora, a sua atual incapacidade de fazer algo que refreie as consequências das crises económicas faz com que a mesma classe trabalhadora que promete proteger despreze essas palavras vazias. Se há um empobrecimento generalizado da população, não há discurso ideológico que trave um inexorável caminho de radicalização da classe trabalhadora.
Relativamente à dinâmica interna do partido, em 2023, Catarina Martins deixou a liderança do partido após o mau resultado das eleições de 2022 e após 10 anos de liderança. Nas palavras dirigidas aos militantes, no discurso em que anunciou que não se iria recandidatar à liderança do partido, falou de “um sinal de um fim de um ciclo político” e que “é agora que o Bloco deve começar a preparação da mudança política que já aí está”. Parece que os eventos políticos que se seguiram com a demissão de António Costa deram razão a Catarina Martins. Assim sendo, quem assume agora a liderança do BE é uma já muito conhecida Mariana Mortágua. Esta escolha não surpreende o eleitorado, mas deixa a interrogação no ar se o BE sofre um problema de renovação de quadros: nos candidatos pelos círculos eleitorais vê-se ainda as mesmas caras dos últimos ciclos eleitorais. Num partido assumidamente jovem e aguerrido, parece também essencial a dinâmica interna do partido ter este aspeto em conta.
Apesar de as comparações não serem exatamente precisas, parece que, entre a Coligação Democrática Unitária (CDU) e o BE, após ambos terem grandes derrotas eleitorais em 2022, o BE será o partido da esquerda que tem mais perspectivas de futuro, sendo que as sondagens indicam o segurar por parte do BE de intenções de voto na ordem dos 5%, ao contrário da CDU que, desde 2019, tem vindo a cair em queda livre nas intenções de voto, agora com uma percentagem na ordem dos 2%. Sondagens valem o que valem, mas uma coisa é certa: apesar de a derrota do BE ser sintomática de uma tendência da esquerda europeia, não há dúvidas que o BE resiste e persiste, o que permite visualizar um futuro não tão negro como nas conversas de café vai correndo. Acima de tudo, o papel do BE enquanto agregador das esquerdas democráticas e críticas do socialismo PS parece ser a grande aposta para este manter-se relevante e com uma voz sonante no Parlamento.
Isabel Lobo
Departamento Sociedade
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