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Existe algum lugar no mundo em que é seguro ser mulher?

  • Foto do escritor: Jornal Tribuna
    Jornal Tribuna
  • 14 de mar.
  • 3 min de leitura

A situação das mulheres no Afeganistão e o caso Gisèle Pelicot em França mostram que mesmo em países em tese completamente opostos, a misoginia, apesar de distinta em grau e alcance, apresenta-se como um ponto comum a todos os países do globo.


Atualmente, o Afeganistão sob o regime talibã é considerado o país mais repressivo do mundo para mulheres e meninas, segundo a ONU. Proibidas de falar em público, de ouvir a voz uma das outras, de frequentar espaços públicos como parques e ginásios. Desde 2021, um governo composto inteiramente por homens, sem qualquer possibilidade de participação de mulheres na vida política nacional, é uma realidade, mesmo que nos pareça muito distante. Fala-se aqui de um Estado, se assim pode ser chamado, atualmente governado por forças terroristas, o que cria um meio especialmente propício para a existência de uma escancarada violência contra a mulher, em todos os sentidos da palavra. A misoginia, então, manifesta-se não em casos ou áreas da política, mas sim de forma completamente explícita na própria estrutura social afegã, que silencia, exclui, isola, violenta mulheres e meninas.


Por outro lado, temos um Estado de Direito Democrático, considerado berço da defesa dos direitos das mulheres. Em França, surgiram o que seriam as bases do feminismo moderno, como herança da Revolução Francesa. Nesta, Olympe de Gouges (pseudónimo de Marie Gouzes), guilhotinada por defender direitos femininos, criticou a exclusão das mulheres da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789; e em 1791, escreveu uma memorável declaração a dizer que a mulher possuía direitos naturais idênticos aos homens e que, por essa razão, tinha o direito de participar, direta ou indiretamente, da formulação das leis e da política em geral. Em 1949, Simone de Beauvoir publica “O Segundo Sexo”, uma das obras mais importantes para o movimento feminista, onde expõe o desenvolvimento da opressão masculina, analisando múltiplas perspetivas e propondo uma série de demandas para conseguir a emancipação feminina. 


Para além disso, em 4 de Março de 2024, a França foi destaque nos jornais internacionais por ter se tornado o primeiro país a prever o direito ao aborto em sua Constituição, marcando um avanço histórico para o feminismo. No entanto, apesar de um passado sedutor e aparentemente progressista, diferentemente do outro exemplo supracitado, o país está a ser palco de um julgamento completamente assustador, que ganhou atenção internacional. Gisèle, uma mulher de 71 anos, foi, durante uma década, objeto de uma violação em massa, planejada pelo seu próprio marido, que a drogava e convidava dezenas de homens a violá-la inconsciente. Através deste caso, Dominique Pelicot mostra que por trás de tantas conquistas memoráveis, existe uma sociedade complexa, marcada por um machismo estrutural como qualquer outra. O caso ainda reforçou a negação da ultrapassada ideia de que violadores são monstros, pelo contrário, são homens comuns. Logo, desde uma pequena vila em Mazan, sul da França, até Cabul, no Afeganistão, responde-se ao título deste artigo: pelo visto, mulheres nunca estão seguras, nem mesmo dentro de suas próprias casas.


Em suma, por mais que pareça irrealista comparar dois países com características tão paradoxais, estes encontram-se numa linha ténue: a misoginia. Tal afirmação não diminui, de todo, os avanços protagonizados por certos países europeus no que diz respeito aos direitos das mulheres. Na verdade, tão só explicita que, mesmo na mais desenvolvida sociedade, o machismo e a misoginia persistem estruturalmente, impregnados nas mais profundas raízes.


Maria Eduarda Viana

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