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Foto do escritorAndré Góis

Guerra da Ucrânia: o rescaldo da guerra

No dia 24 de fevereiro de 2022, as tropas russas invadiram e atacaram a Ucrânia, levando a uma guerra que se esperava breve; porém, atualmente, ainda dura e parece não pacificar. De facto, é já consensual que a guerra não seguiu os trâmites que Moscovo esperava, visto que Kyiv continua de pé e ucraniano.


Primeiramente, parece importante mencionar que Putin não é a Rússia. No dia 4 de dezembro, o Ministério da Defesa britânico, na sua atualização diária da guerra, revelou que o apoio público dos russos à invasão está a diminuir. Segundo o ministério inglês, um órgão de comunicação russo divulgou dados recolhidos pelo Serviço Federal da Proteção da Rússia, que demonstra que 55% dos russos tendem para conversações de paz com a Ucrânia, ao passo que 25% defendem a continuação da guerra. É importante relembrar que em abril 80% do povo russo apoiava a invasão da Ucrânia.


De acordo com a agência Reuters, já morreram pelo menos 41 mil pessoas, 15 mil desapareceram, 14 milhões estão deslocadas e cerca de 140 mil edifícios foram destruídos. Contudo, os danos reais são incalculáveis, assim como as atrocidades cometidas quer pelo exército russo, quer pelas forças ucranianas.

@SERGII KHARCHENKO/NURPHOTO VIA GETTY IMAGES

Nas palavras de Putin, “a operação militar especial” levada a cabo pela Rússia tem como objetivo defender as repúblicas separatistas de Donetsk e Lugansk, assim como “desnazificar” a Ucrânia e garantir que a mesma não adira à NATO. Efetivamente, a Rússia está onde está e não se pode mover, sendo a Ucrânia vista como um “escudo” entre a Rússia e o Ocidente. Desta forma, para evitar o avanço da NATO, a Rússia adianta-se. Este parece ser o raciocínio de Vladimir Putin; no entanto, com a incursão em terras ucranianas, o líder russo não conseguiu que o Ocidente se retraísse, apenas que a aliança progredisse. Isto é, com a ameaça russa, países que declararam neutralidade há várias décadas viram-se obrigados a aderir à NATO, como o caso da Suécia e da Finlândia, que já se encontram em processo de adesão à NATO. Deste modo, com a dita “operação militar especial”, a NATO vai avançar e Helsínquia ficará apenas a 390 km de S. Petersburgo, uma das maiores cidades russas.


Além do mais, a guerra da Ucrânia parece ter unido o Ocidente. Na verdade, a União Europeia respondeu de forma assertiva e firme, tendo, pela primeira vez, enviado armamento em apoio à Ucrânia. Na mesma senda, os Estados Unidos proporcionaram milhões de dólares em ajuda e equipamento militar à Ucrânia. Ademais, as sucessivas sanções mostram a unidade dos países ocidentais neste tema. Porém, vamos ter que esperar para ver se, em algum momento, os europeus vão escolher o conforto ao invés da solidariedade com os ucranianos.


No que toca a avanços no terreno, nos dias iniciais da invasão, o exército russo tomou de assalto a região de Kherson. Seguidamente, as tropas russas lançaram cerco a Kyiv, dando mote a um dos momentos mais célebres do conflito quando o Presidente da República ucraniano, Volodymyr Zelensky, recusou a oferta dos Estados Unidos para fugir do país, proferindo a frase que ficou mundialmente conhecida “Eu preciso de munições, não de uma boleia”. O que é certo é que afrontados com uma forte resistência ucraniana, as forças ocupantes acabaram por se retirar, concentrando os seus esforços na região do Donbass. Um dos pontos fulcrais, na visão russa, é a cidade de Mariupol. A urbanização portuária é de extrema importância para as ambições russas, uma vez que o controlo da mesma proporciona ligação territorial entre a Crimeia e as zonas separatistas do Donbass. Munidos de uma impressionante força bélica, em meados de junho, a Rússia controlava cerca de 20% do território ucrâniano. No entanto, no início de setembro, Kyiv surpreendeu e arrojou um ataque surpresa na região de Kharkiv, recuperando a mesma. Seguidamente, a 9 de novembro, Moscovo ordenou às suas tropas que se retirassem de Kherson.


O inverno está à porta e os russos vão certamente utilizar o frio que se faz sentir em terras ucranianas para fazer sofrer a sociedade civil e pressionar os dirigentes ucranianos. De facto, nos últimos tempos a Rússia adotou a estratégia de bombardear os postos de energia, de forma a que estes não se encontrem operacionais. Neste momento, milhões de ucranianos não têm luz ou água. A nível militar, o inverno poderá servir para os dois lados se reequiparem.

@CNNPORTUGAL

Por outro lado, a vendeta russa não se fica pela Ucrânia. Na verdade, a força ocupante impôs um bloqueio marítimo, o que impossibilitou a Ucrânia de exportar milhões de toneladas de cereais. Apenas com a intervenção da ONU, em meados de julho, com mediação da Turquia, é que foi possível reatar as exportações. Além disso, o regime de Putin faz uso da dependência que a Europa Ocidental tem do gás russo. De facto, em retaliação às sanções impostas pelo ocidente, as exportações do gás provenientes da Rússia tornaram-se mais inconstantes, o que levou à subida dos preços. Os gasodutos Nord Stream 1 e 2 foram danificados por explosões, levando os países europeus a acusar o regime russo de sabotagem.


Neste momento parece impossível prever o desfecho do conflito; contudo, uma coisa parece certa: Putin esperava uma resistência mais ténue. Na verdade, um dos sinais que nos levam a querer que a Rússia esteja débil é a mobilização parcial que o Presidente da Rússia decretou a 21 de setembro. Em face das perdas de terreno, o líder russo viu-se forçado a mobilizar cerca de 300 mil reservistas. Por outro lado, a ameaça de um conflito nuclear paira no ar. A central nuclear de Zaporija, a maior da Europa, está no centro das hostilidades. O ocupante e o ocupado imputam os bombardeamentos à contraparte. A tensão vivida na central nuclear já levou a ONU a enviar uma equipa de especialistas para inspecionar as instalações.


A guerra segue, as vidas perdem-se, as mães russas esperam pelos filhos que não regressarão, muitos fugiram e quando voltarem encontrarão ruínas. “A guerra é um lugar onde jovens que não se conhecem e não se odeiam se matam entre si, por decisão de velhos que se conhecem e se odeiam, mas não se matam.” (ERICH HARTMAN).


André Góis

Departamento Sociedade


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