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Foto do escritorAna Picado

Mestrados Internacionais 101

Como a vida é feita de pressão e questões, existe um momento exato durante a licenciatura em que os estudantes se deparam com a derradeira pergunta:o que vou fazer depois da licenciatura? Há quem diga que Direito é o curso perfeito, porque abre muitas portas, mas esta sua virtude, por vezes, torna-se na sua principal fragilidade. Com tantas opções, torna-se um pouco difícil tomar decisões, principalmente, quando se sente o valor que estas têm a longo prazo. 

Uma opção que, por vezes, passa despercebida é o mestrado fora de Portugal, em especial, o mestrado num país da União Europeia. Assim, o Jornal Tribuna assumiu a missão de contactar alumni da FDUP que decidiram escolher um mestrado internacional. Agradecemos, desde já, ao Miguel Silva (Universidade de Leiden), Marta Silva (Universidade de Maastricht), Clara Castro e Beatriz Castro (Global Campus of Human Rights), Marta Pires (Colégio da Europa) e Catarina Costa (Universidade de Sapienza) pelo contributo que deram aos estudantes da FDUP partilhando as suas experiências.


  1. Qual a motivação para procurar um mestrado internacional?

Marta Silva – “Eu diria que foi um conjunto de fatores, durante o meu percurso, que me levaram a tomar essa decisão no ano passado. Um exemplo marcante foi quando, no início do segundo ano na FDUP, escrevi uma carta sobre o que a NATO significava para mim e fui selecionada pela Public Diplomacy Division para participar nas celebrações dos 70 anos da Aliança Atlântica em Londres. No mesmo ano, fiz uma study visit a Bruxelas com a ELSA Portugal, às instituições europeias, o que despertou em mim um profundo interesse pelo projeto europeu. No terceiro ano, o desejo de estudar fora foi tão forte que decidi fazer Erasmus+ na República Checa. Essa experiência não só confirmou o meu desejo em estudar no estrangeiro, como consolidou a decisão de fazer um mestrado internacional.”.


Miguel Silva – “Acabei por procurar mestrados em Portugal e fiquei algo desiludido com a oferta, que se concentrava quase exclusivamente em Lisboa. Depois de alguma ponderação, foi-me sugerido procurar alternativas no estrangeiro, e rapidamente fiquei interessado.”.


Marta Pires – “Sempre me interessei pelo intercâmbio cultural e de ideias. Procurar um mestrado internacional não só permite diversificar fontes de conhecimento, como também representa uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional.”.


Catarina Costa – “Sempre quis ter uma experiência internacional durante a licenciatura, mas nunca tive oportunidade de fazer Erasmus devido à pandemia. Inicialmente, a minha ideia era procurar mestrados que me dessem oportunidade de fazer parte do percurso fora de Portugal, mas depois pensei: "Por que não fazer o mestrado completo no estrangeiro?.”.


Clara Castro e Beatriz Castro – “O interesse pela área dos Direitos Humanos surgiu antes do interesse pelo próprio curso de Direito para ambas. A candidatura à FDUP foi pensada já com a ideia de prosseguir uma carreira algures na área do Direito Internacional Público. Pensámos no mestrado em Direito Internacional e Europeu da Universidade NOVA, já bastante reconhecido pelo grau de internacionalização, mas na verdade, também sentíamos necessidade de uma perspetiva interdisciplinar.”.


  1. O que a/o levou a escolher o mestrado que integra?

Marta Silva – “A Universidade de Maastricht foi uma escolha óbvia quando me confrontei com os currículos de outras Faculdades de Direito dentro dos Países Baixos, por ter uma reputação sólida nas áreas de Direito da União Europeia e Direito Internacional Público. (...) Para além disso, o método de ensino baseado em Problem-Based Learning (PBL) é outro ponto forte, porque promove uma aprendizagem que estimula o pensamento crítico entre pares. Nas aulas práticas, éramos cerca de 15 alunos por unidade curricular, a debater a bibliografia que preparamos a cada semana de forma autónoma. O professor aparece como moderador. É completamente diferente.”.


Miguel Silva – “Não foi fácil identificar aquilo que melhor correspondia com as minhas expetativas, mas o mestrado na Universidade de Leiden cativou-me pelo foco que assumia. Tinha uma forte vertente de Direito da União, claramente focado na formação de juristas (o que, na área do Direito bancário e financeiro, nem sempre é claro). Isto, aliado a uma forte reputação internacional, foi suficiente para enviar a candidatura.”.


Marta Pires – “O Colégio da Europa vem no seguimento de um interesse crescente por uma especialização em Direito da União Europeia, em particular, em Direito da Concorrência. A história e reputação do Colégio faz com que seja uma escolha evidente para quem procura aprofundar conhecimento nestas matérias.”.


Catarina Costa – “Na verdade, tinha o sonho de estudar em Itália, então apenas procurei mestrados neste país. Contudo, não existe muita oferta de mestrados nesta área e cujas aulas sejam em inglês… o mestrado na “Sapienza” era o único cujo plano curricular ia de encontro com os meus objetivos e cujas aulas e exames eram integralmente em inglês.”.


Clara e Beatriz Castro – “Aquilo que nos atraiu foi, não só a abordagem interdisciplinar (jurídica, antropológica, filosófica, histórica, etc.), mas também a oportunidade de nos imergimos numa comunidade intercultural tão rica e diversificada (mais de 30 nacionalidades). Além disso, motivou-nos a possibilidade de contactar diretamente com académicos e profissionais reconhecidos (das Nações Unidas, Conselho da Europa, UE, tribunais internacionais, etc.), bem como a dimensão eminentemente prática do programa, que nos permite fazer parte de moot courts e role playing numa base semanal.”.


  1. Como é que decorreu o processo de candidatura? Tem algumas dicas?

Marta Silva – “A maior dica que posso dar é fazer atividades fora das aulas e dedicar tempo à carta de motivação para que espelhe o que somos, e o que queremos ser depois do mestrado. E isso envolve usar linguagem própria e não recorrer a instrumentos de inteligência artificial, senão as cartas são todas iguais.”.


Miguel Silva – “Iniciei o meu processo de candidatura ainda em Outubro/Novembro do ano anterior. Isto pode parecer algo exagerado, mas é importante perceber que existem vários passos no processo, que demoram algum tempo. Se bem me lembro, o prazo em Leiden para concluir a candidatura era Março do ano de entrada, mas aconselho quem estiver interessado a preparar tudo com antecedência.”.


Marta Pires – “É um processo bastante seletivo, em coordenação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, mas que diria que decorreu com tranquilidade. A atribuição de bolsas de mérito que, no meu caso, permitiu cobrir 80% de todos os custos (propina, alojamento e alimentação) torna o processo mais democrático e é demonstrativo de um investimento crescente numa formação de qualidade em assuntos europeus. A principal dica talvez seja a inscrição atempada em aulas de francês!”.


Catarina Costa – “O processo de candidatura a uma faculdade internacional, ainda que seja na União Europeia, envolve muita burocracia, nomeadamente o reconhecimento de diplomas.  A primeira vez que me candidatei (a outra instituição), fui recusada não por não preencher os requisitos, mas por falta de documentos. Assim, a minha dica é que se informem antecipadamente de tudo o que é necessário e falem diretamente com a faculdade para terem a certeza que está tudo em ordem.”.


Clara e Beatriz Costa – “No processo de candidatura, são exigidas duas cartas de recomendação, que podem ser de alguém do meio académico ou do meio profissional – no nosso caso, foram de professores da FDUP. É importante ter em conta que é exigido um certificado de nível C1 de inglês, obtido nos últimos três anos. Se passares à fase seguinte, recebes um e-mail com a marcação de uma entrevista, que dura aproximadamente 30 minutos e normalmente é conduzida por um representante nacional do EMA – no nosso caso, membros do Ius Gentium Conimbrigae (Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra).”


  1. Quais as principais diferenças do ambiente académico?

Marta Silva – “A Universidade de Maastricht é muito inclusiva, muito humana e, nem por isso, perde prestígio ou rigor académico. Por isso, o ambiente é de entre-ajuda, porque estamos todos fora de casa e há essa sensibilidade  em reconhecer que, para muitos, é a primeira experiência fora de casa por parte da própria Universidade.”.


Miguel Silva – “Em Leiden, notei que havia mais espaço para diálogo. Em Portugal, o ensino é mais estruturado e a hierarquia entre docentes e estudantes é mais rígida. Em Leiden, havia esse espaço para exploração de ideias, que considerei construtivo”.


Marta Pires – O Colégio da Europa é muito particular, uma vez que há um intercâmbio cultural ímpar, onde mais de 300 pessoas de mais de 40 nacionalidades diferentes se reúnem na pequena cidade medieval de Bruges e partilham, diariamente, tanto o espaço letivo como as mesmas residências estudantis. O espírito do Colégio é, portanto, incomparável.”.


Catarina Costa – “O ambiente académico é muito semelhante, mas sinto falta de um acompanhamento mais próximo, como por exemplo o de uma Associação de Estudantes, particularmente para os estudantes internacionais de mestrado.”.


Clara e Beatriz Costa – “Não temos propriamente um campus universitário: estamos sediados num mosteiro do século XI (Monastero San Nicolò), no Lido (uma ilha que pertence a Veneza), onde temos aulas todos os dias. Somos cerca de 80 estudantes, de 30 nacionalidades diferentes, com todo o tipo de backgrounds - ⅓ de nós somos de Direito, e ⅔ vêm das mais variadas áreas, como Relações Internacionais, Ciência Política, Serviço Social, Antropologia, Economia ou Filosofia.”.


  1. Como foi a adaptação à vida numa nova cidade?

Marta Silva – “O mais difícil foram as saudades da gastronomia portuguesa, por isso fazia umas visitas relâmpago a Bruxelas para comer francesinha de vez em quando por ser a cidade mais próxima com presença portuguesa. Andar de bicicleta todos os dias tornou-se parte da minha rotina. Mesmo quando chovia — e, diga-se de passagem, chovia muitas vezes — e chegava aos sítios encharcada, não me custava nada. Também ajudava ver os professores a estacionar a bicicleta ao meu lado antes da aula na mesma situação. Para alguém natural de Viana do Castelo que estudou no Porto, o mau tempo não é novidade.”.


Miguel Silva – “Inicialmente foi difícil, já que a minha situação de habitação era algo instável (arranjei maneira de viver em 3 cidades diferentes num mês). Quando finalmente assentei em Leiden, comecei a envolver-me mais com colegas e a conhecer os cantos à cidade. A partir daí, criei rotinas e aproveitei o meu tempo lá.”.


Marta Pires – “Considerando que sou uma “pessoa de pessoas”, costumo dizer que vivo num permanente estado de saudade. Mas não me parece que isso seja algo negativo; ao invés, permite-me procurar não descurar as minhas relações familiares e de amizade, fazendo sempre questão de, estando presente, estar efetivamente presente e, estando longe, demonstrar que continuo por perto.”.


Catarina Costa – “Visitar e viver em Roma são duas coisas muito distintas e devo admitir que os primeiros meses foram um grande choque de realidade. Não só a nível de adaptação à confusão da cidade e da dificuldade em encontrar habitação, mas também a nível de integração. Além disso, apesar de ter feito um curso básico de italiano, era complicado conseguir comunicar, até porque a maioria dos italianos não sabe falar em inglês (às vezes até em lugares mais turísticos). Não obstante, como qualquer estudante deslocado, acabei por encontrar o meu lugar aqui e já sinto que é também um pouco a minha casa.”.


Clara e Beatriz Castro – “Como já referimos, o Campus fica situado no Lido di Venezia, uma ilha a 15 minutos de vaporetto (transporte público) de Veneza. É aqui que vivemos e passamos a maior parte do nosso tempo, tendo em conta que o horário durante a semana é sempre bastante preenchido! Viver em Itália e, em especial, a “dois passos” do centro Veneza tem sido uma experiência inacreditável. Aqui temos o melhor dos dois mundos: estamos integrados na comunidade local do Lido, longe dos turistas, e,  ao mesmo tempo, estamos a dez minutos de Veneza”.


  1. De que forma considera que a obtenção de um mestrado internacional concede uma distinção no mercado de trabalho?

Marta Silva – “Eu acabei o mestrado com a entrega da tese no dia 31 de agosto e comecei, no dia 2 de setembro, a trabalhar na EU Public Affairs. Não posso dizer com certezas absolutas, mas tenho noção de que as probabilidades de acabar um mestrado em Portugal e vir diretamente estagiar para Bruxelas seriam muito mais reduzidas se não tivesse ido para Maastricht (principalmente porque não tive nenhuma outra experiência profissional antes).”.


Miguel Silva – “A ideia de que um mestrado no estrangeiro é algum tipo de distinção extraordinária, cujo brilho ofusca quem lê o teu currículo, é algo exagerada. No meu caso, acho que fortaleceu muito o meu entendimento do quadro normativo europeu e de práticas a nível internacional. Mas teve como custo de oportunidade o facto de não me familiarizar tanto com a realidade portuguesa. Para uns, isso é um tradeoff apetecível, para outros, nem por isso.”.


Marta Pires – “Parece-me que a distinção no mercado de trabalho vem mais pelo tipo de conhecimento adquirido do que pelo local onde foi obtido. É evidente que a reputação de um determinado mestrado facilita as oportunidades de trabalho, mas creio que essa reputação é construída pela solidez académica e não tanto pelo espaço geográfico.”.


Catarina Costa – “Quero acreditar que será um fator diferenciador por toda a experiência a nível escolar, profissional e pessoal.”.


Clara e Beatriz Castro – “Numa área extremamente competitiva como esta (Direitos Humanos), diríamos mesmo que pode ser considerado um pré-requisito implícito ter algum tipo de formação internacional. Entre um candidato que fez toda a sua formação no país de origem e outro que apresenta um currículo mais internacional e diversificado, as organizações e instituições internacionais tendem a escolher o segundo, sem dúvida.”.


  1. Qual o melhor conselho que daria a alguém que está a pensar candidatar-se a um mestrado internacional?

Marta Silva – “O primeiro conselho é investigar a fundo o programa das universidades, o currículo dos professores, e ver, por exemplo, o percurso de alumni no LinkedIn. Não ter medo de fazer perguntas à secretaria da faculdade, e a alunos que estejam neste momento a estudar lá. Outro ponto importante é saber mais sobre a cidade para onde se vai e tratar da candidatura o mais cedo possível, porque arranjar casa é um desafio muito grande por haver pouca oferta (principalmente nos Países Baixos).”.


Miguel Silva – “Define desde logo aquilo que queres tirar do mestrado. Queres trabalhar no estrangeiro, ou voltar para Portugal? Pretendes trabalhar numa vertente internacional, ou acreditas que a área em que te pretendes especializar tem relevantes particularidades no sistema jurídico português? Tens confiança na tua capacidade de desenvolver trabalho e pesquisa académica de alto nível numa língua estrangeira (nomeadamente em Inglês)? Não são perguntas simples, e raramente tens as respostas quando te candidatas. Na minha experiência pessoal, só esclareci algumas das minhas dúvidas durante o mestrado, e ainda pondero as decisões que tomei.”.


Marta Pires – “Diria que o foco na busca de um mestrado internacional deverá estar na qualidade e singularidade da oferta formativa, e não na ideia, por vezes redutora, de ter uma experiência fora de Portugal.”.


Catarina Costa – “Informem-se não só sobre o processo de candidatura, mas também sobre a cidade em si. Procurem falar com pessoas que tenham tido uma experiência semelhante, de modo a evitarem algumas dificuldades que teriam caso viessem ao desconhecido. Envolve alguma coragem estar longe de casa, da nossa família e amigos e às vezes subestimamos essa parte. Contudo, apesar de não ser um processo simples, no final vale muito a pena.”.


Clara e Beatriz Castro – “Se o inglês ainda é uma preocupação para ti, investe! Um bom nível de inglês (e preferencialmente, também de uma outra língua, como o francês) é essencial para conseguires aproveitar a experiência ao máximo e também para a tua carreira no futuro. Se o teu medo é nunca teres vivido fora do país, considera fazer Erasmus + durante a licenciatura, como um “teste” para perceber a tua dinâmica pessoal de adaptação ao sítio (ou sequer se viver no estrangeiro é compatível com o teu estilo de vida/personalidade). Pensando em termos financeiros, se não tens uma rede familiar de apoio que te permita financiar um programa internacional, pesquisa bem e com antecedência as bolsas disponíveis.. Existem oportunidades muito interessantes por aí; (é mesmo uma questão de pesquisar até à exaustão e com bastante antecedência para não deixar passar prazos!).”.


Ana Picado

Departamento Mundo Universitário


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