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Foto do escritorFrancisco Paredes

Mungo

Glasgow é o pano de fundo para Young Mungo, a segunda novela de Douglas Stuart — e sobre a qual recaem elevadas expectativas, na sequência de Shuggie Bain, vencedora do Booker Prize 2020. Nela, narra-se a história de Mungo, um wee [1] de quinze anos, nascido num bairro pobre, que, pelo seu temperamento, escapa à realidade glasgowiana.


Nascido e criado em Glasgow, o autor retrata, de forma profunda, apaixonante e real, a cidade: a masculina classe trabalhadora, os católicos e os protestantes, as rixas entre reputados gangues e as suas disputas pelas ruas, os polícias, a violência, a religião, a família, os tabus, o sexo, o amor.


Uma vez inseridos na narrativa — ponto que faz de um modo tão próprio —, somos transportados para a pele de Mungo, o mais novo dos três filhos. Hamish, o mais velho, depois da morte do pai, vê-se na obrigação de fazer o seu irmão mais novo um homem — tão-só, a saber lutar, a engravidar uma mulher, a ser masculino. Jodie, a irmã do meio, implicitamente, também o faz — em especial, quando lhe pede para “ser homem” e pontapear-lhe a barriga, para abortar o indesejado filho. Finalmente, Maureen, a mãe, que acredita que enviar o seu filho de quinze anos para um acampamento com dois ex-prisioneiros, que conheceu nas reuniões dos Alcoólicos Anónimos, é a melhor solução para o fazer crescer.


No entanto, em meio ao marasmo, Mungo “encontra” paz quando conhece James e o seu doocot [2], que se torna o seu santuário. “Encontra”, porque na mesma medida em que o seu amor floresce e neles cresce uma inexplicável vontade de fugir de Glasgow, o nosso wee é forçado a esconder o seu próprio eu: da comunidade glasgowiana, da família, de James, de si — porque os homens devem ser violentos e heterossexuais, porque a autodescoberta é o preço a pagar-se.


Por fim, Young Mungo é um retrato vívido de um romance complexo, integrado numa sociedade demasiado obscura. A dor sente-se, porque é real. E Douglas Stuart fê-lo bem, assim se justificando as expectativas que o aguardavam desde a sua primeira novela — os tabus são desconstruídos de forma humana e cruel, como a vida de Mungo foi.


Francisco Paredes

Departamento Cultural


[1] Wee [forma oral] ∙ wean [forma escrita]: em escocês, pequeno, jovem, novo.

[2] Doocot [forma oral] ∙ dovecot [forma escrita]: em escocês, pombal.

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