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Sugestões Culturais - novembro

Atualizado: 7 de dez. de 2020


Walt Withman, Poeta da América

Compreender a América, na diversidade da sua vastidão e na vastidão da sua diversidade, é difícil. Interpretá-la, hoje, sem antes proceder a esse exercício, é impossível.

A América, como a Europa, terra da Liberdade, sim. Mas também a América, terra da Vida, não da Igualdade. A América, terra da Felicidade, não da Fraternidade.

Terra do individualismo e do materialismo, é certo, mas do humanismo e da espiritualidade na mesma medida.

Engana-se quem julga que a América, autêntica epopeia de contradições, é dos Republicanos ou dos Democratas; dos brancos, dos negros ou dos latinos; dos homens ou das mulheres; dos ricos ou dos pobres. Muito mais erra quem pensa que é de Donald Trump. Este país, agora e sempre, é de Walt Whitman.

Quem é, então, Walt Whitman, aprendiz de tipografia feito poeta, jornalista discreto que serviu como enfermeiro na Guerra da Secessão?

Ele próprio no-lo diz: “Walt Whitman, um cosmos, o filho de Manhattan, / Turbulento, carnal, sensual, comendo, bebendo e procriando”; Walt Whitman, que crê “na carne e nos apetites”, que “a vista, o ouvido, o tacto são milagres, e cada parte, cada migalha de mim / é um milagre”; Walt Whitman, que nos chama a partilhar a sua descoberta de que “Algo gira sobre algo maior do que a Terra sobre a qual giro,/ Aí a criação é o amigo cujo abraço me desperta./ Talvez possa dizer algo mais. Noções! Imploro pelos meus irmãos e irmãs. / Vedes, ó irmãos e irmãs?/ Não é o caos nem a morte… é forma, união, plano… é a vida eterna… é a Felicidade”; Walt Whitman, que anuncia: “ninguém será menosprezado ou omitido, / A concubina, o parasita, o ladrão, estão pela presente convidados, / O escravo de lábios grossos está convidado, o sifilítico está convidado; / Não haverá diferença entre eles e os demais.”.


Eis um poeta individualista e humanista, materialista e espiritual; um poeta que acredita na Liberdade, na Vida e na Felicidade; em suma, o poeta da América.



André Torres




Milk (Gus Van Sant, EUA, 2008)


E porque nesta reta final das presidenciais norte-americanas todos vivemos alguma tensão, nada melhor do que ver ou rever um bom filme. Milk é a mensagem que precisamos de ouvir - uma apologia à coragem na defesa de direitos e à luta persistente pela conquista da liberdade.

Aos quarenta anos, insatisfeito com uma sociedade profundamente conservadora, Harvey Milk decide mudar o rumo da sua vida. Envolvendo-se na migração de homens homossexuais que se deslocam na década de 70 para o bairro Castro, em São Francisco, o nova-iorquino propõe-se a marcar a diferença. Nesse sentido, sob a influência do movimento de ‘contracultura’ dos anos 60 e apoiado pelo seu companheiro Scott Smith, enceta uma luta pela promoção dos interesses da sua comunidade, que vê sistematicamente oprimidos pelas forças policiais. Num ambiente de profunda desunião e violência, após uma jornada de derrotas, Harvey Milk é eleito supervisor, tornando-se, em 1977, no primeiro homem assumidamente gay a ocupar um cargo público na Califórnia.


A passagem para cena desta história verídica mereceu o Óscar de melhor ator a Sean Penn, que protagoniza a personagem central, assim como o destaque para uma excelente realização. Um percurso de vida inspirador que, se ainda não é conhecido, vale a pena conhecer, numa altura em que os direitos civis continuam a ser um tema fulcral e incontornável, mesmo nas sociedades ditas evoluídas.

Beatriz Castro



Fahrenheit 9/11 (Michael Moore, EUA, 2004) - A Miséria Humana como Bem Económico

Este documentário do cineasta Michael Moore é um case-study perturbador do que há de mais podre na política norte-americana. Ancorando-se na tragédia que foi o 11 de setembro, o filme explora a conjuntura política e económica que lhe é anexa, com destaque para a Guerra do Iraque e suas motivações. Nesta fotografia ficam mal políticos, o poder judicial, a imprensa e o alto setor empresarial dos EUA.

A figura de George W. Bush é aqui incontornável. Pintado como incompetente, preguiçoso e corrupto, o membro de uma longa dinastia política do país parecia, ainda assim, destinado à grandeza. O Supremo Tribunal dos EUA entendeu isso mesmo quando, numa eleição marcada por peripécias televisivas e acusações de fraude eleitoral (onde é que já vimos isto?), entendeu que Bush era o legítimo novo líder da nação. O resto foi caos geopolítico.

Neste filme de terror que é a presidência de Bush, a personagem principal de facto é a “arraia-miúda”. As fraturas da opinião pública, no seio das comunidades e dentro dos próprios indivíduos, são evidenciadas. O sofrimento causado pela guerra do Iraque em ambos os lados do Atlântico é retratado de forma gráfica e visceralmente emocional. O horror do conflito é um verdadeiro soco no estômago, que nos obriga a preencher o conceito abstrato de guerra com toda a dor e miséria que esta acarreta.

Só assim se pode cumprir o propósito nobre do filme: no final, perguntarmo-nos, com o espírito investido de toda a honestidade exigida, “tudo isto porquê?”.

Rodrigo Saraiva


“Pure Comedy” (Father John Misty, 2017)


Numa escada com treze degraus, Father John Misty (Mr. Tillman ou Josh para os amigos) guia-nos pela progressivo-cruel piada que é a existência humana.

O álbum, que começa com a faixa que lhe dá nome, não deixa nenhum pecado mortal de fora. Lançam-se flechas ao consumismo, às justificações divinas para a crise climática e à devoção cega a textos escritos por haters de mulheres. Tillman pergunta-se, ainda nesta faixa, onde foram contratados os palhaços que dirigem o circo e porque é que a plateia parece aplaudir as tartes que atiram uns aos outros, enquanto exibem o seu número num estrado de madeira branca. Certamente não parecem ser eles a solução para a crise circense. A resposta? John parece não a encontrar e deixa a tarefa para quem ouve.

Em “Two Wildy Different Perspectives” monta um dueto a interpretar por vozes azuis e vermelhas, parecendo mimicar aquele que ocupou ecrãs e papel nos últimos meses; em “Dying Old Man”, o resultado desse dueto é adivinhado, ao mesmo tempo que lamenta “The homophobes, hipsters, and one percent/ The false feminists he'd managed to detect/ Oh, who will critique them once he's left?”; já “In Twenty Years or so” mostra-se consciente de que uma dúzia de músicas não chega para explicar a condição humana (vinte anos também não chegariam). Nessa nota terminam as gargalhadas da pura comédia e a cortina cai.

Para uma exibição extra sugiro pegar no Spotify e comprar um bilhete para a sessão mais próxima.

Rita Gomes

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