A TAP, especialmente em época de campanha eleitoral, tornou-se uma das maiores peças do xadrez político à data, criando uma nebulosa em torno da companhia aérea. A privatização foi uma questão intensamente discutida, e, no entanto, ficou por perceber, de ambos os lados do espetro político, se é uma questão puramente ideológica, ou se realmente se baseia em medidas pragmáticas do interesse português. Iremos aqui analisar a questão da privatização, se é vantajosa, ou se incorrem mais fatores na tomada de decisão acerca da TAP.
Uma breve história da TAP
Os Transportes Aéreos Portugueses foram fundados por ordem de Humberto Delgado em 1945, sendo inicialmente um serviço privado, passando para uma maioria estatal em 1953. Em 2011 ocorre o acontecimento fulcral que viria a mudar o rumo da história da companhia aérea nacional: José Sócrates compromete-se com a Troika a privatizar a TAP, privatização que foi adiada até 2015, já com um governo de coligação PSD/CDS, que assinou contrato com o consórcio Atlantic Gateway, composto por David Neelman e Humberto Pedrosa, consórcio este que passou a deter 61% do capital do grupo TAP. Após as eleições legislativas de 2015, o governo da “geringonça” liderado por António Costa procedeu de imediato ao processo de trazer de volta a maioria do capital da TAP para o Estado Português.
A 6 de fevereiro de 2016, o Governo assinou o acordo com o consórcio privado que detinha então a maioria, e desde então, a estrutura acionista da empresa é controlada da seguinte forma: 50% pelo Estado Português, 45% pelo consórcio privado Atlantic Gateway, e os restantes 5% na posse dos funcionários da companhia. Com a pandemia provocada pela COVID-19, o tráfego aéreo reduziu-se mais de 90%, e a TAP viu a sua dívida a crescer, e o 1.º trimestre de 2020 contou com uma dívida de 395 Milhões de Euros. A situação de falência técnica da TAP não é resultante exclusivamente da época pandémica, uma vez que somados os prejuízos obtidos ao longo do período 2011-2019, o valor total dos prejuízos é de 571 milhões de euros, face a um único ano de lucro, em 2017, de 23 milhões.
Privatização da TAP, a análise
Quando uma empresa é privatizada, deixa de ser uma propriedade do Estado e os seus gestores passarem a ter como prioridade a maximização do lucro, querendo aumentar a sua concorrência no mercado. As companhias aéreas de propriedade privada apresentam margens de lucro, taxas de retorno e níveis de produtividade superiores às das companhias com propriedade estatal. No entanto, as mudanças no desempenho da empresa não podem ser isoladas de questões políticas, pois o Estado e as Entidades Reguladoras de Competição têm implicações diretas sobre o desempenho financeiro pós-privatização. No geral, as empresas mistas (com ambas as vertentes, pública e privada) têm um desempenho melhor que as públicas, mas pior que o desempenho das privadas.
Os partidos divergem relativamente à questão da TAP. Se a esquerda observa a companhia aérea como um elemento de preservação da soberania nacional, que consegue ainda impedir agentes estrangeiros de dominarem a economia nacional, por outro lado, a direita observa a TAP como um sorvedouro de dinheiro público.
O PCP acredita que ajudas diretas e indiretas às companhias de aviação “low cost” promovidas pela Comissão Europeia ocorrem não pelo desejo de promover a concorrência, mas sim pelo desejo de promover a destruição dessas companhias como elementos de soberania nacional, ao mesmo tempo que promove a concentração em duas ou três grandes companhias ligadas à Alemanha, à França, e vai promovendo um mercado liberalizado que generaliza o modelo de negócio “low cost”, assente na precarização. O PS defende também a TAP, a nível mais pragmático: a transportadora aérea portuguesa continua a ser uma empresa estratégica, não podemos esquecer que antes da pandemia representava 2% do Produto Interno Bruto português, representava dez mil postos de trabalho diretos, cem mil postos de trabalho indiretos, era uma das maiores exportadoras nacionais.
Relativamente à direita, o partido mais veemente na sua posição contra a TAP tem sido a IL, dedicando-lhe todo um ponto no seu programa eleitoral, defendendo a total e irreversível privatização, baseada no facto de não ser uma empresa competitiva e que historicamente acumula prejuízo: Embora em 2020 a TAP representasse nem sequer 1% do PIB, o governo socialista gastou até ao fim do ano quase tanto na companhia como nas principais medidas de apoio ao emprego num ano de pandemia, isto sem incluir os 125 milhões que custou o Lay-Off da TAP. Resumindo, o Governo gastou quase tanto na TAP como no apoio ao emprego a toda a restante economia. Um valor completamente desproporcional, portanto, face às capacidades financeiras do país e à crise que se vivia.
O que fica claro é que a TAP não é viável, neste momento. No entanto, é ainda importante mencionar a aprovação do plano de restruturação da TAP pela Comissão Europeia, no passado dia 21 de dezembro, que envolve auxílio do Estado de 3,2 mil milhões de euros, e alienação das empresas VEM Brasil, Catingpor e Groudforce do Grupo TAP. Segundo Pedro Nuno Santos, a Comissão Europeia fez uma avaliação muito criteriosa de cada euro injetado com o auxílio do Estado e considera que estes 3,2 mil milhões de euros são aceitáveis, por isso entende que TAP é empresa viável a médio/longo prazo e que estes 3,2 cumprem as regras muito apertadas da Comissão Europeia, e que os compromissos feitos não reduzem o negócio, a empresa fica capitalizada e com condições para operar e concorrer num mercado competitivo e continuar a servir a economia portuguesa e a Europa.
Apesar de, teoricamente, as empresas privadas serem mais eficientes que as empresas públicas, percebe-se que não são apenas os fatores económicos que jogam o jogo da TAP, o interesse público e a manutenção da soberania portuguesa perante organizações supra-nacionais são fatores subjetivos que tornam a TAP, acima tudo, num aproveitamento para o jogo político. O plano de restruturação será fundamental para perceber se efetivamente a privatização será inadiável, ou uma questão ideológica pressionada pela oposição ao governo socialista.
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