Lançado a 21 de outubro de 2022, o álbum Midnights, o mais recente trabalho de Taylor Swift, quebrou todos os recordes possíveis e imaginários: a título de exemplo, foi o álbum com mais streams de sempre em 24 horas (184.600.000) no Spotify, o que lhe valeu a atribuição de um Guinness World Record. O álbum tornou-se, tão simplesmente, num dos álbuns mais bem-sucedidos de sempre (isto, claro, em termos numéricos, quer de vendas, quer de streams, que de charts), no curto espaço de vida que tem.
Passado o lançamento, a Miss Americana anunciou uma tour por diversos estádios nos Estados Unidos da América (prometendo anunciar datas internacionais brevemente). A pré-venda dos bilhetes gerou filas de centenas de milhares pessoas e quebrou o recorde de mais bilhetes vendidos num dia na Ticketmaster (2.000.000: dois milhões!) – em termos de comparação, para a tour de reputation, ocorrida em 2018, foram vendidos 2.800.00 bilhetes, ao longo de todo o tempo de venda ao público; ou, num campo mais global, estes números correspondem ao dobro da procura para as 5 tours mais requisitadas e procuradas de 2022 e para o Super Bowl, em conjunto. Mais de 14 milhões de pessoas – o suficiente para encher 900 estádios – tentaram a pré-venda dos bilhetes para a Eras Tour, o que obrigou, inclusivamente, ao adiamento da venda dos bilhetes para o público em geral.
Além dos registos do álbum, da (futura) turnê, também o single “Anti-Hero” tem batido recordes, mantendo-se nos primeiros lugares das tabelas das rádios e das plataformas de streaming.
Posto isto, é altamente provável que se tenha cruzado com o nome da artista responsável por estes feitos nos últimos dias – diria mesmo que é impossível não ter ouvido falar de Taylor Swift desde o final de outubro até esta parte. Parece que o mundo anda obcecado com a música dela and, boy, I understand.
Mas como começou, por onde navega, até onde chegará este fenómeno musical? Estaremos nós a presenciar a formação e consolidação da maior artista da nossa geração? Ora, é sobre isso que me proponho a discorrer hoje. Dear reader / If it feels like a trap / You’re already in one.
A caminhada de Swift na indústria musical começa em tenra idade – descobriu a paixão pela música aos 9 anos, começou a escrever canções e a tocar guitarra aos 12, assinou o primeiro contrato aos 14, lançou o primeiro álbum aos 16 (Taylor Swift, 2006). O resto, como se diz na gíria, foi História.
Começou a carreira com uma veia claramente country, quer no tipo de música que escrevia e lançava, quer na imagem que escolheu mostrar ao mundo (com referência especial às botas de cowboy que utilizava) – influências sobretudo visíveis no seu debut album (Taylor Swift, 2006), quer no seu segundo álbum (Fearless, 2008).
É precisamente com Fearless que os destaques nos charts começam a chegar – com o single “Love Story” consegue o quarto lugar no Billboard Hot 100: foi a primeira música country a alcançar tal feito; com o single “You Belong With Me”, consegue chegar ao pódio do Billboard Hot 100, ficando em segundo lugar. O álbum foi o mais vendido no ano de 2009, nos Estados Unidos, e galardoado com o Grammy de Melhor Álbum do Ano.
Dois anos mais tarde, a 25 de outubro de 2010, foi lançado o terceiro álbum de estúdio: Speak Now. Todas as músicas nele presente – todas – foram escritas solitariamente por Swift, que as co-produziu, igualmente. Valeu-lhe dois Grammys.
Em 2012, o mundo conheceu Red, cujo lead single, “We Are Never Ever Getting Back Together”, alcançou o recorde de single mais vendido no iTunes. Na aventura de criar um álbum que misturasse pop, country e rock, contou com a ajuda do gigante-produtor Max Martin e Shellback.
Volvidos, mais uma vez, dois anos, em 2014, assiste-se a um momento de viragem musical na sua discografia: com 1989, introduz uma veia pop e começa as colaborações com Jack Antonoff. Daqui resultaram alguns dos seus sucessos musicais que encheram – e enchem – as rádios de todo o mundo, como “Shake It Off”, “Blank Space”, “Bad Blood”, “Style” e “Wildest Dreams”. Venceu, novamente, o Grammy de Melhor Álbum do Ano.
Posteriormente a todas as polémicas que marcaram o ano de 2016 (que envolveram, entre outros, Kanye West e Kim Kardashian), e após o seu desaparecimento da ribalta e das redes sociais, com reputation, em 2017, protagonizou o maior come back alguma vez visto, com o single “Look What You Made Me Do”. Seguiu-se uma tour, eternizada pelo concerto-filme Taylor Swift: reputation Stadium Tour, disponível na Netflix.
Em 2018, Swift troca a Big Machine Records pela Universal/Republic Records, em preparação do seu sétimo álbum de estúdio, Lover (2019). Com o single “ME!” (entoado em conjunto com Brendon Urie dos Panic! at the Disco) e “You Need To Calm Down”, abriu caminho a uma nova era (da qual faz parte, igualmente, o documentário Miss Americana, disponível na Netflix). Deste álbum resultaram dois importantes incidentes: o primeiro, envolve as disputas com Scooter Braun pelos Direitos de Autor dos seus primeiros sete álbuns; o segundo, envolve o cancelamento da turnê, por força da pandemia covid-19.
Ora, a pandemia trouxe a impossibilidade do mundo ouvir ao vivo a Miss Americana, mas possibilitou o lançamento de folklore (2020), vencedor do Grammy de Melhor Álbum do Ano (e que mereceu um especial – folklore: the long pond studio sessions, disponível na Disney+), e de evermore (2020), cujos produtores foram Antonoff e Aaron Dessner (dos The National) – provavelmente, os álbuns de Swift mais aclamados pela crítica, reflexo da sua maturidade lírica e do seu expoente criativo.
Por outro lado, as disputas com Braun levaram a que a cantora, impedida de ser proprietária dos seus antigos trabalhos, os regravasse. Os re-recordings começaram em novembro de 2020 e deles resultaram, até hoje, Fearless (Taylor’s Version) e Red (Taylor’s Version) – portanto, ainda nos falta receber Taylor Swift, Speak Now, 1989 e reputation. Ou seja, e como sumaria a própria, sempre que se veja, a seguir a um destes títulos “(Taylor’s Version)”, significa, muito simplesmente, que a Taylor Swift receberá os créditos, lucros e benefícios do seu próprio trabalho.
Estas regravações do seu trabalho prévio têm permitido, além de um empréstimo de tom de voz mais maduro às canções da adolescência, uma renovada produção musical, bem como o lançamento de inéditos – ou, melhor dizendo, músicas que foram escritas e compostas à época do primeiro lançamento do álbum, mas que haviam sido descartadas, sendo agora resgatadas (estas faixas serão identificadas com um “(From The Vault)”). Foi o que sucedeu com a canção “All Too Well (10 Minute Version) (Taylor’s Version) (From The Vault)”, que foi acompanhada de um short film, protagonizado por Sadie Sink e Dylan O’Brien, que tem varrido prémios de melhor vídeo, melhor curta-metragem, entre outros.
E todo este background acaba por nos permitir vislumbrar um longo caminho, de uma artista que se reinventou ao longo dos tempos, que ousou pisar em vários terrenos musicais, que passou por momentos de fragilidade e impopularidade, mas que não deixou de singrar – no fundo, é o caminho de alguém que voltou sempre mais forte do que uma trend dos anos 90.
Aos 32 anos, é provavelmente das artistas mais bem-sucedidas na indústria – de tal modo que, a este ponto, tudo o que faça, lance ou produza vai, com toda a certeza, quebrar recordes (cujos limiares, muitas das vezes, tinham sido por si traçados). Ask her why so many fade but she’s still here.
No fundo, o que se trata é de perceber que a Taylor Swift, no caminho que tem feito ao longo dos últimos (mais) de 15 anos, consolidou uma base de fãs incomparável com qualquer outra, mas não deixou explorar e de inovar em diferentes terrenos musicais, sem nunca perder a lealdade e fieldade de quem a seguia. E prova disso é a relação estreita que mantém com quem aprecia o seu trabalho, por exemplo, na rede social TikTok.
O que se trata é de perceber que muitos têm na sua música um refúgio para qualquer situação da vida que enfrentam: seja um incentivo contra uma adversidade, seja uma almofada para chorar, seja um curativo para o coração, seja um pedaço de felicidade, seja um ensinamento – para qualquer que seja a situação da vida que se afigure perante nós, muito provavelmente, haverá uma música da Taylor Swift adequada a ela. A abundância e ecletismo da sua discografia assim o permitem.
Isto porque, contrariamente a dogmas a que muitos aderem, os 10 álbuns que perfilham o seu nome não são meros conjuntos de breakup songs – limitar o seu trabalho a tal seria, por um lado, redutor, tendo em conta a vastidão de temas tratados pela sua lírica (reflexões e introspeções pessoais, familiares, amigabilidade, histórias ficcionais e imaginadas criativamente, questões sociais e políticas, etc.) e, por outro lado, irónico, dado que grande parte dos artistas masculinos baseiam os seus trabalhos em redor desses temas (o que é legítimo) sem que tal seja notado ou apontado como crítica pelos demais.
Enfim, será a Miss Swift a grande, a maior, artista da nossa geração? Em bom rigor, só o tempo dirá e a concorrência será, certamente, feroz, de peso e detentora de outros feitos de remarque histórico. Mas o que não podemos ignorar é que estamos perante uma artista singular, que escreve todas as suas canções, que as produz, que escreve e dirige os seus videoclipes; de uma artista que voou do country ao pop, ao rock e ao folk; de uma artista que começou por escrever letras das suas canções favoritas nos braços antes de cada concerto e que, agora, esgota centenas de estádios e prepara uma tour como só poucos conseguem; de uma artista que começou o seu percurso como uma adolescente em busca de um sonho distante e que se mantém no ativo enquanto mulher, sem medo de lutar pelas suas posições e pelo que considera ser justo em função do seu trabalho; de uma artista que (se) inovou, recriou e reestabeleceu: she never goes out of style; enfim, de uma artista que mudou, em menor ou maior escala, para o bem ou para o mal, a indústria musical. Mas – e, quem sabe, sobretudo – estamos perante uma artista que marcou diferentes gerações, que as viu crescer e que as acompanhou em diferentes fases das suas vidas: é a artista que domina a sua juventude, a sua adolescência e/ou os seus primeiros anos de vida adulta, e a quem, de uma maneira ou de outra, todos temos (mais do que) uma memória associada – no fundo, uma artista em forma de uma bola de espelhos, que é capaz de nos mostrar todas as versões de nós mesmos.
From sprinkler splashes to fireplace ashes
I gave my blood, sweat, and tears for this
I hosted parties and starved my body
Like I'd be saved by a perfect kiss
The jokes weren't funny, I took the money
My friends from home don't know what to say
I looked around in a blood-soaked gown
And I saw something they can't take away
'Cause there were pages turned with the bridges burned
Everything you lose is a step you take
So make the friendship bracelets
Take the moment and taste it
You've got no reason to be afraid
(“You’re On Your Own, Kid”, Midnights, 2022)
Martina Pereira
Cultural
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