Morte de Henry Kissinger
No passado dia 29 de novembro, faleceu Henry Kissinger, um político e diplomata americano que serviu como Secretário de Estado e Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos da América (EUA) nos governos dos presidentes Richard Nixon e Gerald Ford. Kissinger, conhecido por ser um acérrimo defensor da Realpolitik (“política exterior baseada em avaliações de poder e interesse nacional”, muitas vezes utilizado pejorativamente como tipos de política coercitivas, imorais ou maquiavélicas), deixa um legado extremamente controverso, nomeadamente no seu papel no apoio dos EUA a regimes ditatoriais: no golpe militar que implantaria a ditadura de Pinochet no Chile, numa atitude conciliatória com o Estado Novo em Portugal, e na sua conivência com a anexação de Timor Leste pela Indonésia (que levaria a um genocídio de quase um quarto da população timorense). Não obstante, acabaria por ganhar um prémio Nobel da Paz, em 1973, pelo seu papel no fim da guerra no Vietname e do envolvimento dos EUA na mesma. Por muitos odiado, por alguns respeitado, mas nunca esquecido: Henry Kissinger deixa um legado sui generis.
Isabel Lobo
Departamento Sociedade
Israel a apagar a Palestina
À data de 7 de novembro deste ano, estima-se que tenham sido danificados ou até mesmo destruídos mais de cem sítios de elevado valor patrimonial e histórico graças aos bombardeamentos israelitas em Gaza.
Ao longo dos séculos, a região de Gaza tem sido influenciada pelas várias civilizações que por lá passaram. Esta herança cultural encontra-se em risco perante a constante destruição de museus e locais arqueológicos e religiosos da faixa. O presidente da Heritage for Peace, organização não-governamental realizadora do relatório que permitiu esta estimativa, afirma que, embora o território seja pequeno, contém muito património e que este relatório vem provar o quão importante é protegê-lo.
O estudo afirma que a mesquita Omari, uma das mais importantes da Palestina, a mesquita Ibn Uthman e a mesquita Sayed Hashem foram reduzidas a escombros e que a Igreja de São Porfírio, a terceira mais antiga do mundo, ficou danificada. Um cemitério com dois mil anos, no qual se encontravam dezenas de sepulturas antigas e dois sarcófagos raros, foi completamente destruído.
Francisca Bastos
Departamento Sociedade
“A Antártida está a acordar”: o maior iceberg do mundo volta a movimentar-se após 37 anos
Entre 19 de Outubro e 24 de Novembro, a missão Sentinel-1A do Programa Copérnico da Agência Espacial Europeia (ESA) [1] capturou uma série de imagens, divulgadas na rede social X [2], que demonstram a movimentação de uma massa de gelo por centenas de milhas náuticas no sentido noroeste, ao largo da costa do continente antártico.
Chama-se A23a [3] e é nosso conhecido desde 1986. Foi nesse ano que se separou da plataforma de gelo Filchner, que rachou e dividiu-se nos icebergs A22 a A24, fenómeno que se tem tornado alarmantemente mais comum devido às alterações climáticas. O A23, foi o maior destes, albergando uma base científica soviética, a Druzhnaya 1, que foi sazonalmente ocupada entre os verões austrais de 1975 e 1986. O seu “irmão” A24, foi levado pelo giro oceânico de Weddell, da corrente circumpolar antártica, para águas mais quentes a norte, levando ao seu derretimento e fragmentação. Estes pequenos icebergs representavam um perigo maior para embarcações por não serem detectáveis em radares.Em fevereiro de 1987, uma missão de resgate, a bordo do navio Kapitan Kondratiev, coletou os restos do equipamento da base abandonada.
Em agosto de 1986, ficou encalhado no Mar de Weddell, na margem oriental da Península Antártica, originando uma “ilha de gelo”. O espécime tem 400 metros de altura (para comparação, a Torre Eiffel tem 300), sendo que destes 90% estão submersos. A área que ocupa é de 4000 km² (o distrito de Leiria, p. ex., tem cerca de 3500 km²). Provavelmente, até ao seu eventual desaparecimento, libertará mais de 1 bilião de toneladas de água derretida.
O A23a está agora a aproximar-se da Passagem de Drake, a corrente marítima com maior volume do mundo, é conhecida por ser um pesadelo para marinheiros e um “cemitério de icebergues”. No seu trajeto, poderá ainda colidir com a ilha da Geórgia do Sul (o que já aconteceu com A68a, em 2020), o que causaria um enormíssimo dano aos ecossistemas locais de focas, pinguins e aves marinhas, perturbando os seus padrões de alimentação.
Hugo Almeida
Departamento Sociedade
[1]: Os dados e relatórios de missão do satélite Sentinel-1A e do seu “irmão” polar Sentinel-1B, podem ser consultados publicamente aqui
[3]: Segundo o U.S. National Ice Center (USNIC), a nomenclatura dos icebergs está relacionada com o quadrante da Antártida onde foram originalmente avistados. Estes dividem-se em sentido contrarrelógio, das letras A a D. Neste caso, a letra A corresponde às longitudes de 0 a 90.º Oeste (nos mares de Bellingshausen e de Weddell). O número é atribuído pela ordem do avistamento (foi o 23.º iceberg avistado naquele quadrante), já a letra no fim aplica-se quando se tenha soltado de um icebergue previamente avistado (o sufixo a significa que foi o primeiro a se soltar do iceberg originário)
O futuro do lobbying
A propósito da Operação Influencer, a necessidade de regulamentar o lobbying voltou a ser tema de debate. Diogo Lacerda Machado, amigo de António Costa, é suspeito de ser o pivô de uma teia destinada a influenciar as decisões do Estado a favor do projeto Start Campus. Embora as fronteiras não sejam fáceis de definir, o lobbying e o tráfico de influências são figuras autónomas. No segundo caso estamos a falar de um crime, no primeiro de uma atividade que é permitida pelas instituições da UE desde 2011, estando regulada na maior parte dos países europeus.
Em Portugal, só o Bloco de Esquerda e o PCP são declaradamente contra a regulação do lobby. O PS, PSD, PAN e Livre já referiram que o tema será retomado na próxima legislatura. O parlamento chegou a aprovar um diploma em 2019, mas foi vetado pelo Presidente da República por três lacunas essenciais: não abranger a presidência da república, não obrigar os lobistas a declarar os seus vencimentos e só prever o registo dos principais profissionais em contacto com o poder político. O PS e o PAN trabalharam outra vez em 2021 num texto conjunto, mas a votação foi adiada sem explicação plausível. No último ano, PAN e Chega apresentaram propostas, mas a sua discussão nunca chegou a ser agendada. Tudo isto é bem revelador do quão incómoda e controversa é a discussão da regulamentação do lobbying em Portugal, mesmo para as forças políticas que a defendem.
O lobby pode ser definido como a representação plural de interesses legítimos de empresas, categorias profissionais e organizações junto de autoridades públicas. Esta representação pode ocorrer no âmbito do exercício do poder executivo, legislativo ou jurisdicional e no âmbito de diferentes níveis de governação (junto do Estado, junto de municípios…). No exercício de lobby discutem-se temas relacionados com políticas públicas, podendo envolver redação de normas, celebração de parcerias, realização de contratações, entre outros. Segundo a OCDE, a regulamentação do lobby é necessária porque “há risco de monopólio de influência de grupos de interesse estreitos; a influência pode ser indevida ao ser exercida por meio de práticas duvidosas e ilícitas; sem regulamentação, as políticas públicas podem ser formuladas de forma indevida, ocasionando resultados insatisfatórios e desconfiança das instituições públicas”. Porém, a mesma OCDE refere que esta regulamentação deve ser feita ao abrigo dos princípios de máxima transparência, integridade e acesso da sociedade no processo de representação de interesses.
Pedro Delgado Alves, deputado do PS, considera que uma lei que regule o lobbying já vem tarde e sublinha que a regulação do lobbying é “indispensável e urgente, porque é o que permite que quem faz licitamente contactos para fornecer informação o possa fazer de forma registada, consultável, pública e claramente separar as águas de quem não está a fazê-lo de forma lícita". Teremos de esperar pela próxima legislatura para saber que novas propostas serão feitas sobre este tema.
Francisco Simões
Departamento Sociedade
Um jogo de xadrez no Largo do Rato
Um mês decorrido sobre a eclosão de um processo judicial no espectro mediático, motivo da apresentação de demissão por parte de António Costa das funções executivas, bem como da liderança do Partido Socialista, permanece constante a influência do ocorrido no debate público, sobretudo quanto à sucessão no Largo do Rato.
Além do já recorrente opositor às posições tomadas pelo PS nas últimas décadas, Daniel Adrião, dois rostos procuram liderar a força político-institucional socialista, chamando a si a soberania da liberdade, da justiça social, e da igualdade enquanto motes, porém, nas última semanas, a campanha interna encabeçada por José Luís Carneiro e Pedro Nuno Santos parece ter sofrido um volte-face no que concerne ao “costismo”- se, no começo, a disputa pelos lugares cimeiros se cimentava na legitimidade hereditária associada à influência de António Costa, de momento, há uma escusa quase plena ao prolongamento do paradigma político dos últimos 8 anos.
A reação petreamente eufórica dos militantes temperada com o natural temor de quem pode dentro de 1 mês passar a fazer caminho de bandeira ao ombro e punho erguido na retaguarda daquele em que não viu (e, de súbito, passa a ter de ver) o líder ideal para o país.
Cenário este que praticamente anula o sentido de disputa interna, tornando-a num frente a frente de homens de Estado, de líderes carismáticos imbuídos da certeza de que encabeçarão a barca nacional nas próximas jornadas.
Há, contudo, um ponto-chave que pauta esta conjuntura: a clivagem entre o militante de base- a lógica “1 cidadão, 1 voto” (nas palavras de José Luís Carneiro)- e os grandes caciques eleitorais, o poder persuasivo da estrutura e da comunicação instantânea, lastro sob Pedro Nuno Santos.
Por ocasião do 99º aniversário de Mário Soares (e mote das comemorações oficiais do centenário do seu nascimento), trilha caminhos sinuosos e ténues a sua “magnum opus” , entre um filho das encostas graníticas de Baião, autarca com provas dadas de competência e proximidade com o povo a cujos corações parece conseguir apelar (José Luís Carneiro), e um filho da burguesia industrial que soube mover o país ao longo das décadas de transição do século XX para o nosso tempo, paralelamente carreirista partidário e governativo, dotado de um carisma comunicacional que parece mover massas, e do sedutor trunfo da convergência à esquerda, como da pacificação sindical (Pedro Nuno Santos).
Passada a disputa pelas origens humildes, resignados ambos aos setores etários que a um e a outro sustêm, resta a inversão de sentido na comunicação: José Luís Carneiro, que se tem voltado para a sociedade civil, assumiu nas última semanas a moldagem do monolítico interno e Pedro Nuno Santos, depois de conquistada a quase plenitude da Juventude Socialista, conjugada com tão estratégicos como bizarros apoios da ala centrista do PS, assume agora como objeto os militantes indecisos dispersos no bolo social.
Naturalmente, o ponto mais confortável parece mesmo ser a oposição; que raramente supera quer um quer outro putativo sucessor de Costa, fazendo desta uma quase pré-campanha às eleições legislativas convocadas por Marcelo Rebelo de Sousa para 10 de março de 2023.
Bruno Martins
Deprtamento Sociedade
Partido Socialista ou apenas “Partido”?
O Partido Socialista (PS) denomina-se como “socialista”, conceito este teorizado, pela primeira vez, cientificamente, por Karl Marx e Friedrich Engels, tendo sofrido posteriores “revisões” por várias personalidades, dando origem, por exemplo, à chamada “social-democracia”.
A social-democracia nada mais é do que a tentativa do Sistema Capitalista de criar um Estado Assistencialista, que apoie os trabalhadores, sem resolver os problemas fundamentais do sistema como, por exemplo, a acumulação da mais-valia pelos empresários. Historicamente, tal ideologia foi criada como uma tentativa da burguesia de não abandonar a sua influência política, prevenindo os trabalhadores de aderir à corrente marxista e, deste modo, a não afastá-la do poder. De um modo simples, o custo de oportunidade da social-democracia é menor do que no caso em que se impõe a Ditadura do Proletariado.
O governo demitido, liderado pelo primeiro-ministro António Costa, entrou, recentemente, em funções de gestão. Daremos uma breve olhada no seu trabalho socialista.
Com o Serviço Nacional de Saúde (SNS) deteriorado, estando os portugueses confrontados com falta de profissionais e serviços encerrados, a solução continua a ser o emprego de quase metade do orçamento para a Saúde nos privados. Para além disso, fecha-se este ciclo costista com a contínua e irresolvível precarização dos profissionais de saúde, assistindo-se, cada vez mais, à saída dos trabalhadores do SNS.
Na educação, a luta dos professores continua. As turmas sobrelotadas também continuam. Num estudo realizado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), a aprendizagem dos alunos portugueses encontra-se mal consolidada, em comparação com outros países.
Na Defesa, o desinvestimento prossegue. As nossas Forças Armadas rapidamente estão a tornar-se em Forças Desarmadas. Precariedade, falta de efetivos, falta de equipamentos militares. Assiste-se a um problema estrutural, herdado e continuado pelos sucessivos governos socialistas e sociais-democratas.
A nossa economia está a ser desmontada. O setor produtivo, em Portugal, está a tornar-se numa miragem em Portugal, sendo que o poder político insiste na ideia de que é o mercado imobiliário e o turismo que formam a riqueza de uma economia.
Ah, o fantasma da corrupção… Esse nunca desaparece. Muitos apoiantes do PS dirão que a culpa é apenas dos agentes que cometem o ilícito. Contudo, e com tudo aquilo que se assiste e já assistiu, não será o problema da corrupção cada vez mais estrutural e cada vez menos individual?
Este debate poderia continuar, já que, do ponto de vista político-ideológico, é útil e rico em perspectivas. No entanto, os meios da Comunicação Social centram-se, atualmente, na corrida eleitoral entre Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro, representando ambos esta face da social-democracia: nunca criará uma sociedade sem classes pela via da reforma, apoiando sempre o Sistema Capitalista.
Diogo Lamego
Departamento Sociedade
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